quarta-feira, 11 de abril de 2007

A malfadada licenciatura e o artigo 484.º do Código Civil


O Pinóquio Tecnocrata fala à noite, em conversa aprazada com jornalistas da RTP, empresa pública tutelada pelo ministério da propaganda e, também, pelo Pinóquio, ele próprio. Não irá encarar e responder a quem trouxe a público o imbróglio da malfadada licenciatura e reiteradamente lhe pediu que comentasse os dados colhidos, mas a quem pouco noticiou ou abordou o melindroso assunto…

Pinóquio tem diploma de licenciado (ou certificado de habilitações, que não chega a ser diploma, mas faz as vezes e sempre é mais barato). Pelo que se conhece e do que se suspeita, o diploma foi-lhe concedido por Universidade sem qualquer crédito, que agora obriga ao seu encerramento compulsivo. Pinóquio pediu equivalência a vinte e cinco disciplinas do curso; antes mesmo que certificasse as que por outras bandas fizera, deram-lhe pressurosamente, fazendo fé nas palavras do ilustre declarante, equivalência a vinte e seis (algumas não coincidindo com as solicitadas e uma de bónus); faltar-lhe-iam cinco disciplinas. Curiosamente, nestas que lhe foram propostas Pinóquio seria fluente ou bastar-lhe-ia uma revisão da matéria, porque já cursara semelhantes assuntos, enquanto noutras, que nunca estudara, foi-lhe concedida “equivalência”, ficando isento de as estudar. Coisa de pouca monta, porque não iria exercer e não seria por aí que a casa viria abaixo.

Como trabalhador-estudante atarefado (membro de governo), Pinóquio não ia às aulas, ou ia a muito poucas; chegava tarde aos exames, sentava-se lá atrás, afastado de eventuais incómodos olhares indiscretos, escrevia descansadamente as respostas e, imagine-se, sobrava-lhe o tempo, saindo antes da hora. Dizem colegas que fez quatro dos cinco exames. Um mesmo professor, já então empregado do governo de que Pinóquio fazia parte, afirmou-se professor e examinador desse conjunto; da outra disciplina não consta a frequência nem exame feito pelo regente da cadeira; colmatando o esquecimento, acudiu o próprio magnânimo Reitor, afirmando ter sido ele o regente e examinador.

Na citada Universidade trabalhavam ao Domingo, fazendo exames ou, pelo menos, preenchendo e assinando livros de termos. Assim se explicaria a data de conclusão do curso constante do diploma de licenciado. Como o trabalho abundava, preenchiam poucos papéis (daí que tão poucos tenham sido mostrados); mas, que importava se passados cinco anos ia “tudo pró maneta”? Perante a desorganização de então, talvez a força das calamitosas circunstâncias de agora permita o aparecimento de mais uns quantos papéis (de matrícula, de pagamento de propinas ou de concessão de isenção, de livros de ponto das aulas, de pautas de exame, talvez não, porque terão ido "pró maneta", mas, quem sabe, talvez livros de termos ou o simples processo individual do aluno, mais composto, porque valioso e é o que permitirá certificar o diploma e as habilitações pelos anos fora, em qualquer data)…

Pinóquio obteve um diploma de licenciado; não o roubou nem falsificou: foi-lhe concedido por uma Universidade sem qualquer crédito, que vai ser encerrada compulsivamente, na qual foi matriculado. Não se suspeita que o haja traficado. Coloca-se apenas em dúvida, legitimamente, se não terá sido clamorosamente beneficiado, ainda que tal não procurasse (credo!), com violação de prazos e de outras minudências legais, assim como das regras mais elementares dos procedimentos que conferem credibilidade às Universidades, e se desse eventual benefício não terá a dita Universidade, por sua vez, beneficiado também, ainda que indirectamente.

Embora se saiba como costumam ser as coisas — uma mão lava a outra, e uns favores a detentores de cargos de poder são sempre úteis — se há erros, leviandades e favores as culpas devem ser assacadas a quem passa diplomas, não a quem os procura obter. Poucas provas mais serão precisas para confirmar que os escrúpulos não abundavam por aquelas bandas, povoadas por gente que parece não ser virgem em negócios pouco claros, como os que trouxeram aquela Universidade para a praça pública. Culpados, se os há, estão bem identificados. Por isso, malandragem, por favor, não manchem a honra de quem nada teve que ver com o assunto e ainda fez o esforço de voltar aos bancos da escola novamente se matriculando.

Apesar da falta de crédito da Universidade concessora e das dúvidas que a concessão suscita a quem conhece apenas os dados já divulgados, a eventual ilicitude da concessão não foi nem irá ser investigada, porque não há qualquer queixa de fraude e porque quem tinha por dever investigar (primeiro, regularmente, o ministério do ensino superior, depois, perante as suspeitas, o ministério público e a polícia) não mostra interesse em qualquer investigação. Aliás, investigar a concessão daquele diploma arrastaria investigar a de outros, e poderia conduzir ao destapar de um autêntico rio de merda, exalando nauseabundo fedor, constituindo grave risco para a saúde pública, tal a caterva de políticos que por ali arranjou diplomas ou aviou umas aulitas. Encerrada a Universidade, acaba-se de vez com a fonte dos podres e elimina-se o risco que o simples existir constituía. Então, nada nem ninguém haverá para investigar…

Seguro do destino que espera o foco da desgraça, garantido por subordinado que escorreitamente assim falou sendo Gago, esperançado que nenhum Morgado terá coragem para desafiar o poder, Pinóquio irá apresentar-se como vítima de mais uma torpe calúnia, vilipendiado por mais uma cabala de despeitados, inconformados com o seu bom desempenho à frente do executivo, e de tenebrosos interesses que pretenderiam atingi-lo porque não terá favorecido os seus intentos. Isso mesmo: o alvo desta campanha difamatória, a pessoa que ela visa atingir, não é o impoluto Pinóquio cidadão, mas o político de êxito Pinóquio Tecnocrata, como bem vincaram já os assessores especialistas em marketing. Embora apenas o primeiro ambicionasse diploma de licenciado, penacho que ao segundo de pouco serve, um e outro são indissociáveis, o que agrava o dano. Que se cuidem, portanto, os mensageiros de tais factos, ainda para mais de veracidade duvidosa ou de todo não comprovados: espera-os, pelo menos, o artigo 484.º do Código Civil!

Cuidem-se! Ouviram? Porque sendo dois os ofendidos, desta vez a choruda indemnização será em dobro!

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