terça-feira, 17 de maio de 2022

O “resgate dos nossos heróis”, as milícias neo-nazistas encurraladas em Azovstal


Segundo foi noticiado ontem, ao início da noite, as forças ucranianas que permanecem na siderurgia Azovstal chegaram na parte da manhã a um acordo com as forças separatistas pró-russas de Donetsk e as forças da Federação Russa para a evacuação de feridos e de outros combatentes. Para o efeito, dez soldados ucranianos saíram com bandeiras brancas de um dos buracos abertos pelos bombardeamentos daquelas instalações. Segundo fontes russas no terreno, o número de membros das forças ucranianas cercadas na siderurgia é de 2.227, dos quais se renderam agora 265 (51 feridos, 20 dos quais incapazes de andarem, e outros 214).

Embora este acto possa estar inserido, eventualmente, em conversações e negociações mais gerais para a troca de prisioneiros de ambos os lados em conflito, o acordo foi concretizado sem a participação directa do governo nem do exército ucraniano, embora seja apresentado como “em cumprimento de ordens superiores”. Pelo que dizem o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky e a vice-primeira-ministra Iryna Vereshchuk nas suas homilias de propagada, o acordo é atribuído à acção conjunta dos serviços secretos, do exército, da guarda nacional, das forças da defesa territorial e da defesa de fronteiras (glória à Ucrânia!). Para não afectarem o moral das tropas, estes farsantes nem falam em rendição “dos nossos rapazes, dos nossos heróis”.

O ridículo propagandístico é tal que nas suas comunicações aqueles governantes não mencionaram que os combatentes foram "evacuados" pelas forças ucranianas separatistas pró-russas e pelas forças da Federação Russa que montavam o cerco à siderurgia Azovstal, tendo sido levados para o hospital de Novoazovsk e para a colónia penal da cidade de Olenivka, na região de Donetsk, localidades por elas controladas, onde os feridos irão ser tratados e os restantes combatentes irão ser interrogados, confinados e detidos. Até para informar o seu povo, o que prevalece é a mentira do espectáculo propagandístico montado sem escrúpulos pela produtora do farsante presidente.

A maioria dos membros das milícias Azov é muito jovem, sem qualquer profissão civil, que não sabe fazer nada sem armas na mão, pois alistou-se aos 16 ou 17 anos. Em entrevista, o fundador e primeiro comandante do batalhão Azov, Andriy Biletsky, reconheceu que “é uma unidade treinada por instrutores da NATO permanentemente desde há oito anos” e que “alguns deles ainda eram crianças em idade escolar em 2014... e um número significativo são nacionalistas ucranianos ideológicos”, o eufemismo usado para designar a ideologia neo-nazi que professam. Ainda segundo ele, a ONU recusou-se a evacuar estes combatentes, alegando que ia contra a sua política cuidar de combatentes feridos: "eles são soldados, então têm duas opções: ou se rendem ou morrem”.

Dos combatentes que se renderam nem todos pertencerão ao batalhão Azov, pelo que se vê pelo semblante de homens maduros de um ou outro. Alguns serão militares do exército e da guarda nacional ucranianos e outros serão mercenários estrangeiros e membros de grupos de voluntários de extrema-direita, todos adstritos à defesa de Mariupol e que foram sendo encurralados na siderurgia pelas forças separatistas pró-russas de Donetsk e da Federação Russa, mantendo em seu poder, como escudos, centenas de civis (muitos deles mulheres e crianças, alguns seus familiares, que foram entretanto evacuados pelos sitiadores sob o patrocínio da ONU e que andaram em campanha a fazer apelos internacionais para a sua libertação e salvação). São o reflexo da Ucrânia enquanto Estado falhado, já antes da guerra o país mais pobre e corrupto da Europa, e do infame papel que o regime ucraniano se prestou a desempenhar ao serviço dos EUA.

“Para salvar vidas, toda a guarnição de Mariupol cumpriu a ordem aprovada pelo comando militar e aguarda o apoio do povo ucraniano”, disse o Batalhão Azov numa mensagem publicada nas redes sociais. Nessa mensagem é também afirmado que durante 82 dias “os defensores de Mariupol cumpriram ordens, apesar das dificuldades, repeliram as forças avassaladoras do inimigo e permitiram que o exército ucraniano se reagrupasse, treinasse mais pessoal e recebesse um grande número de armas dos países parceiros”. Não admira, portanto, o desespero com que combateram, usando habitações como refúgio e postos de combate e civis como escudos humanos, contribuindo para a destruição da cidade, numa guerra híbrida em que para eles e o farsante presidente vale tudo.

Segundo uma declaração do comandante destas forças, que não as acompanhou, a “evacuação” terá sido determinada superiormente e executada em cumprimento das ordens recebidas, num acto que seria sem grande dignidade se tais combatentes fossem verdadeiros militares, pois que em simultâneo estaria sendo preparado um plano B, sobre o qual nada adiantou. Exemplo da falta de dignidade e da irregularidade destas forças é o facto de as que se apresentaram para rendição serem apenas a “arraia-miúda”, a “carne para canhão”, não acompanhada dos respectivos comandantes, os quais procuram ganhar tempo para que a sua rendição e a dos mercenários mais experientes e dos oficiais superiores estrangeiros que verdadeiramente as comandavam seja negociada.

Esperemos para ver o que se esconderá nas caves das vastíssimas instalações do complexo siderúrgico de Azovstal e que tem sido tão bem guardado e defendido, qual o plano B que se segue e que manobras de evasão, ou de martírio, estarão preparando tão desqualificados “heróis”, genuínos representantes do regime fascista ucraniano. E esperemos também para ver como qualificarão as forças russas uma tal ralé neo-nazi.


ADENDA (2022.05.18)

A representante do Ministério do Negócios Estrangeiros da Rússia, Maria Zakharova, acusou o presidente Zelensky de mentir. Apresentar “a saída de pessoas (de Azovstal), que a Rússia vem oferecendo há várias semanas, como sendo uma sua operação humanitária é mostrar ao mundo inteiro como eles aprenderam a mentir nos últimos anos sob a liderança principalmente de especialistas americanos e da NATO em geral”, disse a representante em entrevista em 18 de Maio. Zakharova destacou ainda que a Rússia se ofereceu para realizar a operação de retirada dos militantes Azov do território de Azovstal no mesmo formato desde Abril e anunciou corredores humanitários diariamente.

A este propósito, não deixa de ser interessante o discurso desconexo e inflamado de uma das anafadas falcoas, talvez a mais agressiva das “analistas” televisivas, que dá pelo nome de Helena Ferro Gouveia, que hoje na TVI, frente ao Major-General Agostinho Costa, entre outras pérolas negava que se tratasse de uma rendição, ao mesmo tempo que reclamava o tratamento de prisioneiros de guerra para os “evacuados”, pondo em dúvida que a Rússia assim os tratasse; tal como refutava o carácter neo-nazi do “batalhão Azov” (que terá sido, mas desde que foi integrado nas forças regulares ucranianas deixou de ser! Eventualmente, por ter sido submetido a medidas de reeducação política, que por muito fortes não conseguiram apagar as tatuagens da rapaziada, ou por terem repartido a sua asquerosa ideologia com novos companheiros, "digo eu de que...").

Esta artista não é caso único, tem mais duas ou três parceiras, de quem parece nem se dar ao trabalho de pensar e mais não faz do que repetir a propaganda dos EUA e da Grã-Bretanha (neste caso, postada diariamente pela secção dos serviços secretos especializada em desinformação, os quais passaram a ter por missão também manipular a opinião pública do seu país e do mundo). E até o falinhas mansas António José Telo, outro dos falcões e abalizados “analistas” que se têm empenhado na central americana de propaganda e de manipulação de massas CNN-Portugal, na SIC e na Rádio Observador na defesa do “ocidente” ou do “mundo livre” contra a Rússia, na véspera já havia afirmado que não se tratava de uma rendição, mas de uma operação concertada de troca de prisioneiros, uma vitória dos ucranianos... Quando a realidade os contradiz, os trastes ficam desvairados.


ADENDA II (2022.05.19)

Entretanto, foi noticiado hoje que mais combatentes cercados em Azovstal se renderam (sem condições). Desde 16 de Maio já se terão rendido 1730 combatentes (entre eles 80 feridos). Também hoje, os militares russos confirmaram que os representantes do Comité Internacional da Cruz Vermelha e do grupo de negociação ucraniano foram autorizados a visitar os combatentes ucranianos rendidos e avaliar as condições da sua detenção. A delegação chegou em 18 de Maio, dois dias após a rendição do primeiro grupo de Azovstal. A evacuação foi liderada pela Direcção Principal de Inteligência do Estado-Maior da Federação Russa.

Respigo para aqui, colhido na net, o comunicado do outro lado:

”Em 18 de Maio, um importante evento foi realizado como parte da retirada da guarnição de Azovstal. Representantes do Comité Internacional da Cruz Vermelha e do grupo negociador ucraniano avaliaram as condições de detenção de prisioneiros de guerra ucranianos em instituições médicas da RPD e num campo especialmente equipado, organizado pelo Serviço Penitenciário Federal da Federação Russa. O lado ucraniano foi representado pelo Deputado do Povo da 9ª convocação da Verkhovna Rada, Alexander Ivanovich Kovalev, que chegou de Kiev.

No início, a delegação visitou o 15.º hospital da cidade de Donetsk, que abrigava prisioneiros de guerra gravemente feridos que tinham sido retirados de Azovstal dias antes. Ninguém escondeu nada dos convidados. Representantes do lado ucraniano e da Cruz Vermelha visitaram as enfermarias onde os feridos estavam alojados e tiveram a oportunidade de falar com eles.

– Está tudo bem, disse um soldado ucraniano.

Depois de visitar o hospital, a delegação foi para um acampamento para militares ucranianos que tinham preservado a saúde, organizado em Yelenovka de acordo com todos os requisitos da Convenção de Genebra sobre o Tratamento dos Prisioneiros de Guerra.

A vice-primeira-ministra da Ucrânia, Irina Vereshchuk, tinha proposto anteriormente que a colocação dos rendidos fosse na cidade de Energodar, na região de Zaporozhye, que está sob o controle da Rússia. A proposta foi recusada por uma série de razões objectivas, principalmente relacionadas com a segurança.

Tudo foi organizado oficialmente — aprovações, chamadas, uma breve alocução do chefe da instituição e verificação de documentos — e aconteceu de acordo com um plano pré-aprovado.

Comunicação com o contingente:

– Repito, seu objectivo é sobreviver. Seus entes queridos estão esperando por você em casa.

Inspecção de locais de detenção:

Os negociadores ucranianos estavam convencidos do cumprimento por parte da Rússia dos acordos alcançados durante as negociações. Eles prestaram atenção à ausência de grades nas janelas das instalações residenciais.

– Alexander Ivanovich, como avalia o que viu?

– Se levarmos em conta que são condições de primeira linha, que só passou um dia, então tudo foi feito rapidamente, sei que foi feito à noite. É melhor que sejam as próprias pessoas a dizer, e elas dizem que não têm queixas.

A delegação visitou os alojamentos de homens e mulheres. Eles conversaram, garantiram que ninguém torturava os prisioneiros, que ninguém zombava deles. Eles são alimentados, tratados e fornecidos com tudo o que precisam.

– Como avalia os resultados desta inspecção conjunta com a Cruz Vermelha?

– Eu acho que a Cruz Vermelha irá comentar sobre isso. Eu sei como esta missão foi feita. Foi muito difícil. Houve muito esforço de todos os lados para chegar a um acordo. Sei que durante o dia foi entregue aqui tudo o que era necessário: acessórios para dormir, tudo para receber as pessoas em condições normais. Pelo que vimos hoje, obviamente, tudo o que foi prometido foi feito. Atenção especial deve ser dada ao fato de os médicos terem trabalhado muito na reabilitação de nossos feridos durante o dia.

A operação bem-sucedida ocorreu graças à Direcção Principal de Inteligência do Estado-Maior da Federação Russa, e foi conduzida por militares russos. A libertação de prisioneiros de guerra em Azovstal continuará em 19 de Maio, o que significa que a visita da delegação foi concluída com sucesso.”


ADENDA III (2022.05.20)

Ao início desta madrugada, foi confrangedor constatar a ignorância de um dos rapazolas da CNN-Portugal (de quem não fixei o nome, nem isso importa) quando questionava o Major-General Carlos Branco, o qual teve a pachorra de lhe dar uma pequena lição sobre as causas próximas da guerra da Rússia contra a Ucrânia e sobre os seus efeitos (no caso, sobre um imaginado bloqueio dos portos do Mar Negro, cujas águas foram minadas pelas forças ucranianas, que impediria a saída em segurança dos navios graneleiros de cereais e de oleaginosas, mesmo que as causas possam ser múltiplas, por exemplo, o aumento dos preços dos fretes e dos seguros, visto tratar-se duma zona de guerra).

Ele nem é dos mais agressivos, e presumo que seja um dos muitos estagiários inexperientes e mal pagos de que a central de propaganda e de manipulação de massas se aproveita para cumprir o seu papel. Isso não justifica tudo, porque quando é necessário fazer perguntas que não constam do guião e dar seguimento à conversa é imperativo dominar os assuntos, nem que seja ao de leve. É mais um exemplo da grande falta de cultura da rapaziada que se pretende afirmar como jornalista. Sem verdadeiros jornalistas isentos e cultos na redacção que a ajude, o resultado não poderia ser muito diferente.


quinta-feira, 12 de maio de 2022

NATO, essa “aliança militar defensiva”


Segundo noticiado, a Finlândia (país neutro desde há 75 anos) e a Suécia (com uma tradição de neutralidade de dois séculos) preparam-se para aprovar os seus pedidos de integração na NATO. Pela narrativa “ocidental” ou do “mundo livre”, uma “aliança militar defensiva” que alberga os EUA, a Grã-Bretanha e os países europeus continentais mais desenvolvidos economicamente e militarmente melhor equipados prepara-se assim para passar dos actuais 30 membros para 32 e para se estender ao longo de toda a fronteira ocidental da Rússia, aumentando a capacidade de bloquear os movimentos da sua frota no Mar Báltico e no Mar Negro.

Esta decisão, que vem sendo ponderada desde o início da invasão da Ucrânia pela Rússia, é tomada numa altura em que a Rússia, por debilidades várias, atravessa dificuldades de progressão no terreno na sua aventura militar, mas é fundamentada no aumento do risco para a segurança daqueles países que a Rússia terá passado a representar desde então. É estranho que um país económica e militarmente debilitado, como é o caso da Rússia, passe a constituir uma ameaça maior agora do que dantes, mas é esta a narrativa fantasiosa que está sendo usada pelos medíocres políticos que governam os países europeus para justificarem a política guerreira em que envolvem os seus povos, no imediato, entre outras coisas, para obterem ganhos nas disputas eleitorais em que alguns estarão envolvidos ainda este ano.

Outra narrativa fantasiosa propalada continuamente é a de que a NATO seria uma aliança militar “defensiva”, o que contraria todos os factos e evidências. Desde a sua criação, em 1949, a NATO tem como objectivo a guerra contra a Rússia (até 1991, contra a URSS), e em diversas ocasiões traçou planos operacionais e realizou manobras para concretizá-la. Nunca a NATO interveio como aliança militar na defesa de qualquer dos países membros, porque eles não foram ameaçados nem, muito menos, atacados pelo seu inimigo (embora a Turquia tenha sido atacada por outros seus inimigos). Ao invés, as suas intervenções foram sempre ofensivas, contra países que os EUA designaram como seus inimigos e sem que tenham sido por eles atacados.

Os exemplos mais recentes do carácter da NATO como aliança militar ofensiva ao serviço dos interesses dos EUA foram a participação nas guerras de agressão que a potência imperialista dominante perpetrou contra a Sérvia, em 1999, para concretizar a secessão do Kosovo, contra o Iraque, em 2003, com base na patranha de que este país possuía armas de destruição massiva e que ameaçava os seus interesses, e contra a Líbia, em 2011. Ao contrário do que é cinicamente difundido, a NATO foi sempre um instrumento militar da política agressiva dos EUA contra a Rússia (e também contra outros países, ao sabor dos interesses dos EUA), e ainda hoje os seus objectivos são fundamentalmente os que o seu primeiro secretário-geral, Lord Ismay, disse cruamente uma vez: “manter os americanos dentro (da Europa), os russos fora e os alemães na mó de baixo”.

O argumento mais utilizado para fundamentar o carácter “defensivo” da NATO é o famoso artigo 5.º do tratado, que estipula que a aliança só actuará em caso de agressão a qualquer dos países membros. Esta é mais uma das falácias que os EUA propalam e que os media engajados vendem para consolar mentes infantis. Se um qualquer país membro desencadear uma agressão armada contra a Rússia e esta retaliar, em legítima defesa, conforme a Carta da ONU, o citado artigo 5.º justificaria a entrada da NATO em guerra contra a Rússia. Era o papel que estava destinado para a Ucrânia se a sua admissão não tivesse sido bloqueada em 2008. A contrariedade não impediu que ela, mesmo fora da aliança, fosse usada como agente provocador. E é também o papel que a Polónia repetidamente se tem oferecido para desempenhar intervindo abertamente na Ucrânia, que por tão evidente tem sido rejeitado.

A adesão da Finlândia e da Suécia nesta altura, quando um dos argumentos invocados pela Rússia para a sua aventura militar na Ucrânia foi precisamente a ameaça à sua segurança pelo prometido alargamento da NATO a este país, visará a necessidade de aumento da segurança dos novos candidatos ou estará integrada no objectivo de “enfraquecer a Rússia” já proclamado pelos EUA, a potência imperialista dominante que a dirige? Doravante, se a Finlândia, com uma extensa fronteira comum e com forças armadas numerosas e bem equipadas, aceder à instalação no seu território de bases permanentes da NATO ou dos EUA, poderá passar a constituir uma verdadeira ameaça para a segurança da Rússia, a que ela, em função da evolução da situação e dentro do que lhe for possível, não deixará de ter de responder.

Esperemos pela narrativa que os “avançados mentais” de direita e de extrema-direita “avençados” e engajados na despudorada campanha de manipulação de massas que por aí vai, desta vez de olhos reluzentes de contentamento, nos tentem impingir para desvendar o fenómeno, tratando-nos como “atrasados mentais”.


ADENDA (2022.05.16)

Não foi necessário esperar muito pelas justificações dos falcões e das anafadas falcoas que rejubilam com a “criação de uma nova ordem mundial” pelo fortalecimento da NATO. Mesmo que na sua retorcida argumentação metam os pés pelas mãos — porque enquanto afirmam, nos seus inflamados prognósticos antes do fim do jogo, que a Rússia está derrotada na Ucrânia, por não ter conseguido atingir nenhum dos seus objectivos, justificam o alargamento da NATO pela ameaça que ela, mesmo enfraquecida, passou a representar para a Finlândia e a Suécia — os estrategas de sofá e grandes investigadores e cientistas da geopolítica mais sofisticada, que povoam as cátedras universitárias e aparecem todos os dias nos ecrãs televisivos a emprestarem um ar de “seriedade” à campanha de manipulação de massas que por aí vai, não escondem o seu contentamento.

Como os oceanos não têm fronteiras, não tardará muito a NATO alargará o seu âmbito ao mundo inteiro, do Atlântico ao Índico e ao Pacífico, ou para esse efeito estabelecerá associações com as outras alianças militares dos EUA na região (a QUAD, englobando a Austrália, a Índia e o Japão, e a recém-formada AUKUS, integrada pela Austrália e o Reino Unido), sempre como “aliança militar defensiva”, no caso, para proteger a potência imperialista dominante do perigo que a China representa para o seu domínio. Embora a próxima cimeira de Junho, em Madrid, esteja prevista ser dedicada essencialmente à admissão dos novos membros, mesmo assim dela poderá sair uma qualquer indicação sobre estes objectivos dos EUA. Então, os “avançados mentais” entrarão em êxtase, tratando-nos como “atrasados mentais”.


terça-feira, 10 de maio de 2022

Manobras dos fuzileiros navais dos EUA no Mar Negro são exercícios de rotina, para a tropa de prontidão não perder a “forma”


Os exercícios de ataque anfíbio a navios de guerra, que se desenrolam ao largo da costa da Roménia, assim como o ataque às forças russas que ocupam o famoso ilhéu das Serpentes poderão não passar de manobras de distracção, mas curiosamente ocorrem enquanto milhões de toneladas de cereais e de oleaginosas se encontram retidos nos silos do porto de Odessa e são lançados repetidos apelos “à comunidade Internacional” para criar as condições de segurança necessárias para o seu escoamento.

E os “avançados mentais” de direita e de extrema-direita “avençados” e engajados na despudorada campanha de manipulação de massas que por aí vai, cegos pela raiva, calam mais estes factos e continuam a vomitar atoardas de louvaminha da NATO como “aliança militar defensiva” (que nunca foi) do “ocidente” e do “mundo livre”, dirigida pela potência imperialista dominante e usada na provocação à Rússia que espoletou a guerra por procuração que contra ela trava na Ucrânia, tratando-nos como “atrasados mentais”.


sexta-feira, 29 de abril de 2022

EUA “tudo farão para enfraquecer a Rússia”…


Embora este tenha sido desde sempre o seu objectivo, os EUA deixaram agora de o esconder e dizem-no abertamente. E justificam que será “para que a Rússia não possa voltar a fazer o que está fazendo na Ucrânia”. Trocado por miúdos: “para que a Rússia não tenha a veleidade de enfrentar de novo os EUA”. Daí que se tenham prestado a arcar com a maior parte das despesas para suportar o prolongamento da guerra e empenhado a dar as ordens ao farsante Presidente da Ucrânia. Os “avançados mentais” de direita e de extrema-direita “avençados” e engajados na despudorada campanha de manipulação de massas que por aí vai, cegos pela raiva, calam o facto e continuam a vomitar atoardas de louvaminha ao regime fascista ucraniano, tratando-nos como “atrasados mentais”.

Para este seu objectivo, os EUA usaram a Ucrânia como ponta de lança numa guerra por procuração. Como as coisas parece não estarem correndo como previsto, apesar da incapacidade da Rússia em armamento moderno para enfrentar uma guerra contra uma tão grande coligação que se formou contra si e das burradas tácticas que tem cometido (a incursão nortenha de cerco a Kiev e agora os atrasos na ofensiva no Donbass, previamente anunciada!), os EUA juntaram há pouco (numa sua base militar na Alemanha, veja-se o ponto a que isto chegou) 40 aliados (não se sabe quantos exteriores à NATO, porque além do Japão, da Coreia do Sul e da Austrália não foram nomeados outros) e manobram na India e no Paquistão, em ameaça não só à Rússia mas também à China.

Além do rearmamento em misseis, armas pesadas, aviação de combate e munições (por doação, por empréstimo, por aluguer ou por venda) e do pagamento das despesas de funcionamento do Estado falhado (das pensões dos reformados aos salários do funcionalismo civil e das forças armadas de mais de 500 000 efectivos e de milhares de mercenários), por empréstimos, pelo ouro ucraniano que têm bem arrecadado e pelas receitas dos bens roubados aos russos, os EUA procuram também abrir na Transnístria uma segunda frente de guerra contra a Rússia, envolvendo nessa manobra a Moldávia (país não pertencente à NATO, como convém), que em seu “socorro” poderá juntar rapidamente mais de 15 000 efectivos da Polónia e da Roménia (membros da NATO) e da Ucrânia. E esta escalada da guerra, que poderá não ficar por aqui e chegar ao envolvimento mais directo da Polónia sob um qualquer pretexto, está sendo atribuída aos russos.

Se a Rússia cair nesta nova esparrela, dispersando as suas forças, mete-se numa camisa-de-onze-varas de onde poderá não sair, comprometendo as possibilidades de êxito da sua aventura guerreira na Ucrânia. Pode optar por não responder, sacrificando as reduzidas forças que lá tem estacionadas, mais um volumoso paiol de munições, e abandonando as populações moldavas russófonas à fúria de neo-nazis ucranianos e à raiva xenófoba de polacos e de romenos, deixando a resolução do problema para mais tarde. Deste modo, poria a nu a agressividade do regime ucraniano e dos seus aliados e o que verdadeiramente se joga na Ucrânia. Será doloroso, mas poderá não ter outra escolha.

O Secretário-Geral da ONU, o grotesco António Guterres, que no dia seguinte à invasão a condenou, violando o seu dever de neutralidade, afirmou emocionado na sua recente visita a Kiev que “uma guerra no século XXI é absurdo”, esquecendo-se das muitas guerras ocorridas neste século, dos seus horrores e autores. Apesar do pouco que propôs e obteve da Rússia, a sua anuência para a abertura de um corredor humanitário em Mariupol, para a saída de civis do complexo siderúrgico Azovstal, nada disse sobre a condição posta pelo farsante Presidente da Ucrânia de que só aceitaria se o dito fosse para civis e soldados, milicianos e mercenários, como se os combatentes não tivessem a rendição como alternativa ao combate e à morte e por obrigação a retirada dos civis que têm em seu poder.

Até agora as coisas parecem estar incertas para os EUA, apesar das dificuldades das forças da Federação Russa no terreno. Tanto assim que à habitual agressividade da porta-voz da Casa Branca, a secretária do governo para a imprensa, Jen Psaki, nas suas frequentes comunicações, junta-se agora a farsa da comunicação emocionada do porta-voz do Pentágono, o Estado-Maior das forças armadas (o verdadeiro ministério da guerra), dirigindo novos insultos ao Presidente da Federação Russa. Esta gente, que representa a potência imperialista dominante, que só neste século tem perpetrado as guerras mais destruidoras e mortíferas e que urdiu uma enorme provocação à Rússia e dirige a guerra por procuração que lhe moveu, perdeu todo o pudor e mostra com esplendor o seu cinismo.

Os EUA têm procurado envolver a China no conflito. Primeiro, lançando a suspeita de que estaria fornecendo armamento à Rússia, depois sugerindo-a como mediadora e por fim criticando-a por não condenar a invasão. Ao mesmo tempo, foram ameaçando-a com sanções e realizando provocações diversas (acerca de Taiwan e, mais recentemente, a propósito da aproximação das Ilhas Salomão à China). Mais tarde ou mais cedo, se a Rússia correr o risco da derrota, a China tomará o seu partido fornecendo-lhe o equipamento militar necessário para a guerra electrónica de que ela não dispõe nem tem capacidade de produzir em tempo útil. Mesmo que esta não seja para si a melhor altura (pela recessão económica e pela pandemia Covid-19), a China sabe que o mundo não voltará a ser como dantes e que quanto mais débil ficar o seu aliado mais frágil ela própria ficará como o alvo que se segue da potência imperialista dominante.


segunda-feira, 25 de abril de 2022

Viva o 25 de Abril!


E que seja comemorado sem anarco-capitalistas e sem neo-fascistas, nacionais e estrangeiros, à mistura.


terça-feira, 19 de abril de 2022

O mais recente cinismo do farsante: a glorificação como heróis de neo-nazis que usam mulheres e crianças como escudos


Será que quem tanto brama contra o "massacre" de civis por parte das forças russas, dos separatistas de Donbass e dos seus mercenários estrangeiros não se condói com o sacrifício de mulheres e crianças que as forças e as milícias neo-nazis ucranianas e os seus mercenários estrangeiros estão usando como escudos, agora de forma clara, em Mariupol, na siderurgia de Azov?

E será que também não se apercebe do cinismo do farsante Presidente da Ucrânia ao glorificar essas suas forças como heróis? Está tudo cego, surdo e mudo ou comunga do mesmo cinismo? E será que não se apercebe do calibre do traste que os parlamentares da república das bananas aceitaram receber na casa da democracia? Isto vai lindo, não haja dúvidas!


sábado, 16 de abril de 2022

Uma outra opinião desafinada


Respigo para aqui, colhida da net, uma outra opinião desafinada da histeria anti-russa que por aí vai sobre a guerra da Federação Russa contra a Ucrânia. Poderá servir para avisar incautos e instruir palermas que se deixam levar pela mais ampla campanha de manipulação de massas de que me recordo, já que os bandalhos dos cínicos e outras estirpes de trastes são casos perdidos.


*

Jacques Baud é um analista estratégico suíço, especialista em inteligência e terrorismo. Depois de ter sido Coronel do Estado-Maior do exército suíço e oficial dos Serviços de Inteligência Suíços (SRS), tornou-se consultor de empresas privadas. Ele acaba de publicar uma análise sobre a situação militar na Ucrânia que vale a pena visitar e da qual oferecemos grandes excertos abaixo.

PRIMEIRA PARTE: NO CAMINHO DA GUERRA

Durante anos, do Mali ao Afeganistão, trabalhei pela paz e arrisquei a minha vida por ela. Não se trata, portanto, de justificar a guerra, mas de compreender o que nos levou a ela. Observo que os “especialistas” que se revezam nos aparelhos de televisão analisam a situação com base em informações duvidosas, na maioria das vezes hipóteses transformadas em factos, e por isso não se consegue compreender o que se está a passar. É assim que se cria o pânico.

O problema não é tanto quem está certo neste conflito, mas como os nossos dirigentes tomam as suas decisões.

Vamos tentar examinar as raízes do conflito. Começa com aqueles que nos últimos oito anos nos falaram sobre “separatistas” ou “independentistas” do Donbass. É falso. Os referendos realizados pelas duas autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk em Maio de 2014 não foram referendos sobre “independência”, como afirmaram certos jornalistas pouco escrupulosos, mas referendos sobre “autodeterminação” ou “autonomia”. O qualificativo “pró-russo” sugere que a Rússia era parte do conflito, o que não era o caso, e o termo “falantes de russo” teria sido mais honesto. Além disso, esses referendos foram realizados contra o conselho de Vladimir Putin.

De facto, estas repúblicas não procuravam separar-se da Ucrânia, mas sim ter um estatuto de autonomia que lhes garantisse o uso da língua russa como língua oficial. Porque o primeiro ato legislativo do novo governo resultante do derrube do presidente Yanukovych foi a abolição, em 23 de Fevereiro de 2014, da lei Kivalov-Kolesnichenko de 2012 que tornou o russo uma língua oficial. Um pouco como se os golpistas decidissem que o francês e o italiano deixariam de ser línguas oficiais da Suíça.

Esta decisão causa uma tempestade na população de língua russa. Isso resultou numa repressão feroz contra as regiões de língua russa (Odessa, Dniepropetrovsk, Kharkov, Lugansk e Donetsk), que começou em Fevereiro de 2014 e levou a uma militarização da situação e alguns massacres (em Odessa e Mariupol, para os mais importantes). No final do verão de 2014, restavam apenas as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk.

Nesta fase, demasiado rígidos e presos a uma abordagem doutrinária da arte operacional, os estados-maiores ucranianos sofreram o inimigo sem que conseguissem impor-se. O exame do curso dos combates em 2014-2016 no Donbass mostra que o estado-maior ucraniano aplicou sistemática e mecanicamente os mesmos planos operacionais. No entanto, a guerra travada pelos autonomistas estava então muito próxima do que observamos no Sahel: operações muito móveis realizadas com meios leves. Com uma abordagem mais flexível e menos doutrinária, os rebeldes conseguiram explorar a inércia das forças ucranianas para as “encurralar” repetidamente.

Em 2014, estou na NATO, como responsável pela luta contra a proliferação de armas ligeiras, e estamos a tentar detectar entregas de armas russas aos rebeldes para ver se Moscovo está envolvida. A informação que recebemos então vem praticamente toda dos serviços de inteligência polacos e não “encaixa” com a informação proveniente da OSCE: apesar de alegações bastante grosseiras, não observamos nenhuma entrega de armas e materiais militares da Rússia.

Os rebeldes estão armados graças às deserções de unidades ucranianas de língua russa que passam para o lado rebelde. À medida que os fracassos ucranianos progrediam, batalhões completos de tanques, artilharia ou antiaéreos vinham engrossar as fileiras dos autonomistas. É isso que leva os ucranianos a comprometerem-se com os Acordos de Minsk.

Mas, logo após a assinatura dos Acordos de Minsk 1, o presidente ucraniano Petro Poroshenko lançou uma vasta operação antiterrorista (ATO) contra o Donbass. Bis repetita placenta: mal assessorados pelos oficiais da NATO, os ucranianos sofreram uma derrota esmagadora em Debaltsevo, que os obrigou a comprometerem-se com os Acordos de Minsk 2. (…)

É essencial lembrar aqui que os Acordos de Minsk 1 (Setembro de 2014) e Minsk 2 (Fevereiro de 2015) não previam a separação nem a independência das repúblicas, mas a sua autonomia no âmbito da Ucrânia. Aqueles que leram os Acordos (são muito, muito, muito poucos) descobrirão que está escrito na íntegra que o status das repúblicas deveria ser negociado entre Kiev e os representantes das repúblicas, para uma solução interna na Ucrânia.

É por isso que, desde 2014, a Rússia exigiu sistematicamente a sua aplicação, recusando-se a ser parte nas negociações, porque se tratava de um assunto interno da Ucrânia. Do outro lado, os ocidentais – liderados pela França – tentaram sistematicamente substituir os Acordos de Minsk pelo “formato Normandia” [1], que colocava russos e ucranianos frente a frente. No entanto, lembremos, nunca houve tropas russas no Donbass antes de 23-24 de Fevereiro de 2022. Além disso, os observadores da OSCE nunca observaram o menor vestígio de unidades russas operando no Donbass. Assim, o mapa dos serviços de inteligência dos EUA publicado pelo Washington Post em 3 de Dezembro de 2021 não mostra tropas russas no Donbass.

Em Outubro de 2015, Vasyl Hrytsak, director do Serviço de Segurança Ucraniano (SBU), confessou que apenas tinham observado 56 combatentes russos no Donbass. Era um número comparável ao dos suíços que iam lutar na Bósnia durante os fins-de-semana, na década de 1990, ou dos franceses que vão lutar na Ucrânia hoje.

O exército ucraniano estava então num estado deplorável. Em Outubro de 2018, após quatro anos de guerra, o procurador-chefe militar da Ucrânia, Anatoly Matios, disse que a Ucrânia havia perdido 2.700 homens no Donbass: 891 por doença, 318 por acidentes de trânsito, 177 por outros acidentes, 175 por envenenamento (álcool, drogas), 172 por manuseio descuidado de armas, 101 por violação das regras de segurança, 228 por assassinato e 615 por suicídio.

De facto, o exército é minado pela corrupção dos seus quadros e não conta mais com o apoio da população. De acordo com um relatório do Ministério do Interior do Reino Unido, quando os reservistas foram convocados em Março-Abril de 2014, 70% não compareceram na primeira sessão, 80% na segunda, 90% na terceira e 95% na quarta. Em Outubro/Novembro de 2017, 70% dos que foram chamados não apareceram durante a campanha de recolha chamada “Outono 2017”. Isto sem contar os suicídios e as deserções (muitas vezes em benefício dos separatistas) que atingem até 30% dos efectivos na zona ATO. Os jovens ucranianos recusam-se a lutar no Donbass e preferem a emigração, o que também explica, pelo menos parcialmente, o défice demográfico do país.

O Ministério da Defesa ucraniano então recorreu à NATO para ajudá-lo a tornar suas forças armadas mais “atraentes”. Tendo já trabalhado em projectos semelhantes no âmbito das Nações Unidas, fui convidado pela NATO para participar num programa destinado a restaurar a imagem das forças armadas ucranianas. Mas é um processo demorado, de grande fôlego, e os ucranianos querem avançar rapidamente.

Assim, para compensar a falta de soldados, o governo ucraniano recorreu então às milícias paramilitares. Elas são essencialmente compostas por mercenários estrangeiros, muitas vezes activistas de extrema-direita. Em 2020, elas representam cerca de 40% das forças da Ucrânia e contam com cerca de 102.000 homens, segundo a Reuters. Eles são armados, financiados e treinados pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha, Canadá e França. São mais de 19 nacionalidades – incluindo a suíça.

Os países ocidentais, portanto, claramente criaram e apoiaram milícias de extrema-direita ucranianas. Em Outubro de 2021, o Jerusalem Post deu o alarme ao denunciar o projecto Centuria. Essas milícias operam no Donbass desde 2014, com o apoio dos ocidentais. Mesmo que possamos discutir o termo “nazi”, o facto é que essas milícias são violentas, transmitem uma ideologia nauseabunda e são virulentamente anti-semitas. O seu anti-semitismo é mais cultural do que político, razão pela qual o qualificativo de “nazi” não é realmente apropriado. O seu ódio aos judeus vem das grandes fomes dos anos 1920-1930 na Ucrânia, resultantes da confiscação das colheitas por Estaline para financiar a modernização do Exército Vermelho. Ora, este genocídio – conhecido na Ucrânia como Holodomor – foi perpetrado pelo NKVD (antecessor da KGB), cujos escalões superiores de liderança eram compostos principalmente por judeus. É por isso que, hoje, os extremistas ucranianos pedem a Israel que se desculpe pelos crimes do comunismo, como notado pelo Jerusalem Post. Estamos, portanto, muito longe de uma “reescrita da história” por Vladimir Putin.

Estas milícias, oriundas dos grupos de extrema-direita que lideraram a revolução Euromaidan em 2014, são formadas por indivíduos fanáticos e brutais. A mais conhecida delas é o regimento Azov, cujo emblema lembra o da 2ª Divisão SS Panzer Das Reich, que é objecto de verdadeira veneração na Ucrânia, por ter libertado Kharkov dos soviéticos em 1943, antes de [esta mesma 2ª divisão] realizar o massacre de Oradour-sur-Glane em 1944, França.

Entre as figuras famosas do regimento Azov estava o opositor Roman Protassevich, preso em 2021 pelas autoridades bielorrussas na sequência do caso do voo FR4978 da RyanAir. Em 23 de maio de 2021, fala-se do desvio deliberado de um avião de passageiros por um MiG-29 – com a concordância de Putin, é claro – para prender Protassevich, embora as informações então disponíveis não confirmem de forma alguma esse cenário.

Mas é preciso então mostrar que o presidente Lukashenko é um bandido e Protassevich um “jornalista” apaixonado pela democracia. No entanto, uma investigação bastante esclarecedora produzida por uma ONG americana em 2020, destacou as actividades militantes de extrema-direita de Protassevich. A conspiração ocidental então põe-se em movimento e meios de comunicação sem escrúpulos “penteiam” a sua biografia. Finalmente, em Janeiro de 2022, é publicado o relatório da Organização de Aviação Civil internacional que mostra que, apesar de alguns erros processuais, a Bielorrússia agiu de acordo com as regras em vigor e que o MiG-29 descolou 15 minutos depois de o piloto da RyanAir ter decidido pousar em Minsk. Portanto, nenhuma conspiração da Bielorrússia e muito menos com Putin. Ah!… Mais um detalhe: Protassevich, cruelmente torturado pela polícia bielorrussa, agora está livre. Aqueles que gostariam de se corresponder com ele podem aceder à sua conta no Twitter. (…)

Assim, o Ocidente apoia e continua a armar milícias que são culpadas de numerosos crimes contra populações civis desde 2014: estupro, tortura e massacres. Mas, embora o governo suíço tenha sido muito rápido em impor sanções contra a Rússia, não adoptou nenhuma contra a Ucrânia, que vem massacrando a sua própria população desde 2014. De facto, aqueles que defendem os direitos do homem na Ucrânia há muito condenam as acções destes grupos, mas não foram seguidos pelos nossos governos. Porque, na realidade, não estamos a tentar ajudar a Ucrânia, mas sim combater a Rússia. A integração destas forças paramilitares na Guarda Nacional não foi de forma alguma acompanhada de uma “desnazificação”, como afirmam alguns. (…)

Em 2022, muito esquematicamente, as forças armadas ucranianas que combatem a ofensiva russa estão divididas em: Exército de terra, subordinado ao Ministério da Defesa: divide-se em 3 corpos de exército e composto por formações de manobra (tanques, artilharia pesada, mísseis, etc.). Guarda Nacional, que depende do Ministério do Interior e está articulada em 5 comandos territoriais. A Guarda Nacional é, portanto, uma força de defesa territorial que não faz parte do exército ucraniano. Inclui as milícias paramilitares, denominadas “batalhões de voluntários”, também conhecidos pelo evocativo nome de “batalhões de represália”, compostos por infantaria. Treinados principalmente para o combate urbano, agora garantem a defesa de cidades como Kharkov, Mariupol, Odessa, Kiev, etc.

SEGUNDA PARTE: A GUERRA

Ex-responsável pela área das forças do Pacto de Varsóvia no serviço de inteligência estratégico suíço, observo com tristeza – mas não com espanto – que os nossos serviços já não estão em condições de entender a situação militar na Ucrânia. Os autoproclamados “especialistas” que desfilam nas nossas telas transmitem incansavelmente as mesmas informações moduladas pela afirmação de que a Rússia – e Vladimir Putin – é irracional. Vamos dar um passo para trás.

A eclosão da guerra

Desde Novembro de 2021, os americanos constantemente brandem a ameaça de uma invasão russa contra a Ucrânia. No entanto, os ucranianos não parecem concordar. Porquê?

Temos que voltar a 24 de Março de 2021. Nesse dia, Volodymyr Zelensky promulgou um decreto para a reconquista da Crimeia e começou a enviar suas forças para o sul do país. Simultaneamente, foram realizados vários exercícios da NATO entre o Mar Negro e o Mar Báltico, acompanhados por um aumento significativo dos voos de reconhecimento ao longo da fronteira russa. A Rússia então realiza alguns exercícios para testar a prontidão operacional de suas tropas e mostrar que está a acompanhar a evolução da situação.

As coisas acalmam-se até Outubro-Novembro com o fim dos exercícios do ZAPAD 21 [2], cujos movimentos de tropas são interpretados como reforço para uma ofensiva contra a Ucrânia. No entanto, mesmo as autoridades ucranianas refutam a ideia de preparativos russos para uma guerra e Oleksiy Reznikov, ministro da Defesa ucraniano, declara que não houve mudanças na sua fronteira desde a primavera.

Violando os Acordos de Minsk, a Ucrânia está a realizar operações aéreas no Donbass usando drones, incluindo pelo menos um ataque contra um depósito de combustível em Donetsk em Outubro de 2021. A imprensa americana assinala isso, mas não os europeus, e ninguém condena estas violações.

Em Fevereiro de 2022, os eventos precipitam-se. Em 7 de Fevereiro, durante a sua visita a Moscovo, Emmanuel Macron reafirma a Vladimir Putin seu empenhamento nos Acordos de Minsk, compromisso que repetirá após a sua entrevista com Volodymyr Zelensky no dia seguinte. Mas em 11 de Fevereiro, em Berlim, após 9 horas de trabalho, a reunião dos conselheiros políticos dos líderes do “formato Normandia” termina sem nenhum resultado concreto: os ucranianos ainda e sempre recusam-se a aplicar os Acordos de Minsk, aparentemente sob pressão dos Estados Unidos. Vladimir Putin observa então que Macron lhe fez promessas vazias e que os Ocidentais não estão prontos para fazer cumprir os Acordos, como vêm fazendo há oito anos.

Os preparativos ucranianos na zona de contacto continuam. O Parlamento russo está alarmado e em 15 de Fevereiro pede a Vladimir Putin que reconheça a independência das repúblicas, o que ele recusa. Em 17 de Fevereiro, o presidente Joe Biden anuncia que a Rússia atacará a Ucrânia nos próximos dias. Como o sabe? Mistério… Mas desde o dia 16, o bombardeamento de artilharia das populações de Donbass aumentou dramaticamente, como mostram os relatórios diários dos observadores da OSCE. Naturalmente, nem os meios de comunicação, nem a União Europeia, nem a NATO, nem qualquer governo ocidental reage nem intervém. Diremos mais tarde que se trata de desinformação russa. De facto, parece que a União Europeia e alguns países deliberadamente encobriram o massacre do povo de Donbass, sabendo que isso provocaria a intervenção russa.

Ao mesmo tempo, há relatos de actos de sabotagem no Donbass. Em 18 de Janeiro, combatentes do Donbass interceptam sabotadores equipados com equipamentos ocidentais e que falavam polaco tentando criar incidentes químicos em Gorlivka. Eles poderiam ser mercenários da CIA, liderados ou “aconselhados” por americanos e compostos por combatentes ucranianos ou europeus, para realizar acções de sabotagem nas Repúblicas do Donbass.

De facto, já em 16 de Fevereiro, Joe Biden sabe que os ucranianos começaram a bombardear as populações civis do Donbass, colocando Vladimir Putin diante de uma escolha difícil: ajudar militarmente o Donbass e criar um problema internacional ou ficar de braços cruzados e assistir aos falantes russos do Donbass serem esmagados.

Se decidir intervir, Vladimir Putin pode invocar a obrigação internacional de “Responsabilidade de Proteger” (R2P). Mas ele sabe que qualquer que seja a sua natureza ou escala, a intervenção desencadeará uma chuva de sanções. Portanto, se a sua intervenção se limita ao Donbass ou se vai mais longe para pressionar o Ocidente pelo status da Ucrânia, o preço a ser pago será o mesmo. Isso é, aliás, o que ele explica no seu discurso em 21 de Fevereiro.

Nesse dia, atendeu ao pedido da Duma e reconheceu a independência das duas Repúblicas de Donbass e, nesse processo, assinou tratados de amizade e assistência com elas.

Os bombardeamentos de artilharia ucraniana sobre as populações de Donbass continuaram e, em 23 de Fevereiro, as duas repúblicas solicitaram ajuda militar da Rússia. No dia 24, Vladimir Putin invoca o artigo 51 da Carta das Nações Unidas que prevê a assistência militar mútua no âmbito de uma aliança defensiva.

Para tornar a intervenção russa totalmente ilegal aos olhos do público, ocultamos deliberadamente o facto de que a guerra realmente começou em 16 de Fevereiro. O exército ucraniano estava a preparar-se para atacar o Donbass já em 2021, como certos serviços de inteligência russos e europeus estavam bem cientes… Os advogados julgarão.

No seu discurso de 24 de Fevereiro, Vladimir Putin enunciou os dois objectivos da sua operação: “desmilitarizar” e “desnazificar” a Ucrânia. Não se trata, portanto, de apoderar-se da Ucrânia, nem mesmo, muito provavelmente, de ocupá-la e certamente não de destruí-la.

A partir daí, a nossa visibilidade sobre o andamento da operação é limitada: os russos têm uma excelente segurança de operações (OPSEC) e o detalhe do seu planeamento não é conhecido. Mas com bastante rapidez, o curso das operações permite entender como os objectivos estratégicos se traduziram no plano operacional.

– Desmilitarização: destruição terrestre da aviação ucraniana, sistemas de defesa aérea e meios de reconhecimento; neutralização das estruturas de comando e inteligência (C3I), bem como das principais rotas logísticas na profundidade do território; cerco do grosso do exército ucraniano concentrado no sudeste do país.

– Desnazificação: destruição ou neutralização de batalhões voluntários que operam nas cidades de Odessa, Kharkov e Mariupol, bem como em várias instalações do território.

“Desmilitarização”

A ofensiva russa desenrola-se de forma muito “clássica”. Num primeiro tempo – como os israelitas haviam feito em 1967 – com a destruição em solo das forças aéreas nas primeiras horas. Depois, assistimos a uma progressão simultânea em vários eixos segundo o princípio da “água que flui”: avança-se onde a resistência é fraca e deixa-se as cidades (muito vorazes em tropas) para mais tarde. Ao norte, a central de Chernobyl é ocupada imediatamente para evitar actos de sabotagem. As imagens de soldados ucranianos e russos guardando conjuntamente a fábrica naturalmente não são mostradas…

A ideia de que a Rússia tenta apoderar-se de Kiev, a capital, para eliminar Zelensky, vem tipicamente do Ocidente: foi o que eles fizeram no Afeganistão, Iraque, Líbia e o que eles queriam fazer na Síria com a ajuda do Estado Islâmico. Mas Vladimir Putin nunca teve a intenção de abater ou derrubar Zelensky. Pelo contrário, a Rússia procura mantê-lo no poder, empurrando-o para negociar cercando Kiev. Ele recusou-se até agora a aplicar os Acordos de Minsk, mas agora os russos querem obter a neutralidade da Ucrânia.

Muitos comentadores ocidentais manifestaram surpresa pelo facto de os russos continuarem a procurar uma solução negociada enquanto conduziam operações militares. A explicação está na concepção estratégica russa, desde os tempos soviéticos. Para os ocidentais, a guerra começa quando a política cessa. No entanto, a abordagem russa segue uma inspiração clausewitziana: a guerra é a continuidade da política e pode-se passar fluidamente de uma para outra, mesmo no decurso dos combates. Isso cria pressão sobre o adversário e empurra-o para negociar.

Do ponto de vista operacional, a ofensiva russa foi um exemplo desse tipo: em seis dias, os russos tomaram um território tão vasto quanto o Reino Unido, com uma velocidade de progressão maior do que a Wehrmacht fez em 1940.

O grosso do exército ucraniano foi implantado no sul do país para uma grande operação contra o Donbass. É por isso que as forças russas conseguiram cercá-lo desde o início de Março no “caldeirão” compreendido entre Slavyansk, Kramatorsk e Severodonetsk, por um impulso vindo do leste via Kharkov e outro vindo do sul, da Crimeia. As tropas das Repúblicas de Donetsk (DPR) e Lugansk (RPL) completam a acção das forças russas com um empurrão do lado Este.

Nesta fase, as forças russas estão lentamente a apertar o laço, mas já não estão sob a pressão do tempo. O seu objetivo de desmilitarização está praticamente alcançado e as forças residuais ucranianas já não têm uma estrutura de comando operacional e estratégico.

A “desaceleração” que os nossos “peritos” atribuem a uma má logística não é senão a consequência do cumprimento dos objectivos traçados. A Rússia parece não querer envolver-se numa ocupação de todo o território ucraniano. Na verdade, antes parece que a Rússia está a tentar limitar o seu avanço à fronteira linguística do país.

Os nossos meios de comunicação falam de bombardeamentos indiscriminados contra populações civis, particularmente em Kharkov, e são difundidas imagens dantescas repetidamente. No entanto, Gonzalo Lira, um latino-americano que mora lá, apresenta-nos uma cidade tranquila no dia 10 de Março e no dia 11 de Março. É certo que é uma cidade grande e não pode ver tudo, mas isso parece indicar que não estamos na guerra total que nos estão a servir continuamente nos nossos écrans.

Quanto às Repúblicas de Donbass, elas “libertaram” os seus próprios territórios e estão a combater na cidade de Mariupol.

“Desnazificação”

Em cidades como Kharkov, Mariupol e Odessa, a defesa é feita pelas milícias paramilitares. Elas sabem que o objectivo da “desnazificação” é dirigido principalmente a elas.

Para um atacante numa área urbanizada, os civis são um problema. É por isso que a Rússia procura criar corredores humanitários para esvaziar as cidades de civis e deixar apenas as milícias para combatê-las mais facilmente.

Inversamente, essas milícias procuram manter civis nas cidades para dissuadir o exército russo de vir aí lutar. É por isso que elas resistem a implementar esses corredores e fazem todo o possível para que os esforços russos sejam em vão: eles podem usar a população civil como “escudos humanos”. Os vídeos que mostram civis a tentarem deixar Mariupol e a serem espancados por combatentes do regimento Azov são naturalmente cuidadosamente censurados aqui.

No Facebook, o grupo Azov foi considerado na mesma categoria do Estado Islâmico e sujeito à “política de indivíduos e organizações perigosas” da plataforma. Foi, portanto, proibido glorificá-lo, e os comentários que lhe eram favoráveis foram sistematicamente proibidos. Mas em 24 de Fevereiro, o Facebook mudou a sua política e permitiu mensagens favoráveis à milícia. No mesmo espírito, em Março, a plataforma autoriza, nos ex-países do Leste, que se apele ao assassinato de militares e dirigentes russos. Eis os valores que inspiram os nossos dirigentes, como veremos.

Os nossos meios de comunicação propagam uma imagem romântica da resistência popular. É esta imagem que levou a União Europeia a financiar a distribuição de armas à população civil. É um ato criminoso. Nas minhas funções de chefe de doutrina para operações de manutenção da paz na ONU, trabalhei na questão da proteção de civis. Vimos então que a violência contra civis ocorreu em contextos muito específicos. Especialmente quando as armas são abundantes e não há estruturas de comando.

No entanto, essas estruturas de comando são a essência dos exércitos: a sua função é canalizar o uso da força de acordo com um objectivo. Ao armar os cidadãos de forma aleatória como é o caso actualmente, a UE transforma-os em combatentes, com as consequências decorrentes: alvos potenciais. Além disso, sem comando, sem objectivos operacionais, a distribuição de armas leva inevitavelmente a acertos de contas, ao banditismo e a acções mais mortíferas do que efectivas. A guerra torna-se uma questão de emoções. A força torna-se violência. Foi o que aconteceu em Tawarga (Líbia) de 11 a 13 de Agosto de 2011, onde 30.000 negros africanos foram massacrados com armas lançadas de paraquedas (ilegalmente) pela França. Além disso, o Instituto Real de Estudo Estratégico britânico (RUSI) não vê nenhum valor acrescentado nessas entregas de armas.

Além do mais, ao entregar armas a um país em guerra, expõe-se a ser considerado um beligerante. Os ataques russos em 13 de Março de 2022 contra a base aérea de Mykolaiv seguem os avisos russos de que o transporte de armas seria tratado como alvo hostil.

A UE repete a experiência desastrosa do Terceiro Reich nas últimas horas da Batalha de Berlim. A guerra deve ser deixada para os militares e quando um lado perde, deve ser admitida. E se deve haver resistência, ela deve imperativamente ser liderada e estruturada. No entanto, estamos a fazer exactamente o contrário: estamos a pressionar os cidadãos a lutar e, ao mesmo tempo, o Facebook permite apelos de assassinato de militares e dirigentes russos. Aqui estão os valores que nos inspiram.

Em alguns serviços de inteligência, essa decisão irresponsável é vista como uma forma de usar a população ucraniana como carne para canhão para combater a Rússia de Vladimir Putin. Esse tipo de decisão assassina deveria ser deixada para os colegas do avô de Ursula von der Leyen. Teria sido mais sensato entrar em negociações e assim obter garantias para as populações civis do que atirar lenha para a fogueira. É fácil ser combativo com o sangue dos outros…

Maternidade de Mariupol

É importante entender de antemão que não é o exército ucraniano que garante a defesa de Mariupol, mas sim a milícia Azov, formada por mercenários estrangeiros.

No seu resumo da situação de 7 de Março de 2022, a missão russa da ONU em Nova York afirma que “os moradores relatam que as forças armadas ucranianas expulsaram o pessoal do Hospital Natal nº 1 da cidade de Mariupol e instalaram um posto de tiro no interior do estabelecimento.

Em 8 de Março, o media independente russo Lenta.ru publicou o testemunho de civis de Mariupol que disseram que a maternidade foi tomada pelas milícias do regimento Azov e perseguiram os ocupantes civis, ameaçando-os com as suas armas. Confirmam assim as declarações do embaixador russo algumas horas antes.

O hospital Mariupol ocupa uma posição dominante, perfeitamente adequada para a instalação de armas antitanque e para observação. Em 9 de Março, as forças russas atingiram o prédio. Segundo a CNN, haveria 17 feridos, mas as imagens não mostram vítimas nas instalações e não há evidências de que as vítimas relatadas estejam relacionadas com este ataque. Fala-se de crianças, mas na realidade não vemos nada. Pode ser verdade, mas pode ser falso… O que não impede que os dirigentes da UE vejam isso como um crime de guerra… O que permite que Zelensky, logo depois, reivindique uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia…

Na realidade, não sabemos exactamente o que aconteceu. Mas a sequência de eventos tende a confirmar que as forças russas atingiram uma posição do regimento Azov e que a maternidade estava livre de todos os civis.

O problema é que as milícias paramilitares que garantem a defesa das cidades são incentivadas pela comunidade internacional a não respeitar os costumes da guerra. Parece que os ucranianos reencenaram o cenário da maternidade na cidade do Kuwait em 1990, que havia sido completamente encenado pela empresa Hill & Knowlton pelo valor de 10,7 milhões de dólares para convencer o Conselho de Segurança das Nações Unidas a intervir no Iraque para a Operação Tempestade do Deserto.

Os políticos ocidentais também aceitaram ataques contra civis em Donbass durante oito anos, sem adoptarem nenhuma sanção contra o governo ucraniano. Há muito que entrámos numa dinâmica em que os políticos ocidentais concordaram em sacrificar o direito internacional ao seu objectivo de enfraquecer a Rússia.

TERCEIRA PARTE: CONCLUSÕES

Como ex-profissional de inteligência, a primeira coisa que me impressiona é a total ausência dos serviços de inteligência ocidentais em representar a situação durante o último um ano. Na Suíça, os serviços foram criticados por não terem fornecido uma imagem correcta da situação. Na verdade, parece que em todo o mundo ocidental, os serviços foram inundados pelos políticos. O problema é que são os políticos que decidem: o melhor serviço de inteligência do mundo é inútil se o decisor não o ouvir. Foi o que aconteceu durante esta crise.

Dito isto, enquanto alguns serviços de inteligência tinham uma imagem muito precisa e racional da situação, outros claramente tinham a mesma imagem propagada pelos nossos meios de comunicação. Nesta crise, os serviços dos países da “nova Europa” desempenharam um papel importante. O problema é que, por experiência, descobri que eram extremamente maus no plano analítico: doutrinários, não têm a independência intelectual e política necessária para apreciar uma situação com uma “qualidade” militar. É melhor tê-los como inimigos do que como amigos.

Além disso, parece que em alguns países europeus, os políticos ignoraram deliberadamente os seus serviços para responderem de forma ideológica à situação. É por isso que esta crise foi irracional desde o início. Poderá observar-se que todos os documentos que foram apresentados ao público durante esta crise foram apresentados por políticos com base em fontes comerciais…

Alguns políticos ocidentais obviamente queriam que houvesse um conflito. Nos Estados Unidos, os cenários de ataque apresentados por Anthony Blinken ao Conselho de Segurança foram apenas fruto da imaginação de um Tiger Team que trabalhava para ele: ele fez exactamente como Donald Rumsfeld em 2002, que assim “contornou” a CIA e outros serviços de inteligência que foram muito menos assertivos sobre as armas químicas iraquianas.

Os dramáticos desenvolvimentos a que assistimos hoje têm causas que conhecíamos, mas que nos recusámos a ver: – no plano estratégico, a expansão da OTAN (que não tratamos aqui); – no plano político, a recusa ocidental de implementar os Acordos de Minsk; – e no nível operacional, os ataques contínuos e repetidos às populações civis de Donbass durante anos e o aumento dramático no final de Fevereiro de 2022.

Por outras palavras, podemos naturalmente deplorar e condenar o ataque russo. Mas NÓS (isto é: Estados Unidos, França e União Europeia à cabeça) criámos as condições para a eclosão de um conflito. Mostramos compaixão pelo povo ucraniano e pelos dois milhões de refugiados. Está bem. Mas se tivéssemos tido um mínimo de compaixão pelo mesmo número de refugiados das populações ucranianas de Donbass massacradas pelo seu próprio governo e que se acumulam na Rússia há oito anos, nada disso provavelmente teria acontecido.

Que o termo “genocídio” se aplique aos abusos sofridos pelas populações de Donbass é uma questão em aberto. Este termo é geralmente reservado para casos maiores (Holocausto, etc.); no entanto, a definição dada pela Convenção do Genocídio é provavelmente suficientemente ampla para ser aí aplicada. Os advogados agradecerão.

Claramente, este conflito levou-nos à histeria. As sanções parecem ter-se tornado a ferramenta preferida da nossa política externa. Se tivéssemos insistido para que a Ucrânia respeitasse os Acordos de Minsk, que negociámos e caucionámos, nada disto teria acontecido. A condenação de Vladimir Putin é também a nossa. Não adianta reclamar depois do facto, era necessário ter agido antes. No entanto, nem Emmanuel Macron (como garante e membro do Conselho de Segurança da ONU), nem Olaf Scholz, nem Volodymyr Zelensky respeitaram os seus compromissos. Em última análise, a verdadeira derrota é a daqueles que não têm voz.

A União Europeia foi incapaz de promover a implementação dos acordos de Minsk, pelo contrário, não reagiu quando a Ucrânia bombardeou a sua própria população no Donbass. Se ela tivesse feito isso, Vladimir Putin não precisaria reagir. Ausente da fase diplomática, a UE distinguiu-se por alimentar o conflito. Em 27 de Fevereiro, o governo ucraniano concorda em iniciar negociações com a Rússia. Mas algumas horas depois, a União Europeia votou um orçamento de 450 milhões de euros para fornecer armas à Ucrânia, colocando gasolina no fogo. A partir daí, os ucranianos sentem que não precisarão de chegar a um acordo. A resistência das milícias Azov em Mariupol provocará até um aumento de 500 milhões de euros para armas.

Na Ucrânia, com a bênção dos países ocidentais, são eliminados aqueles que são a favor da negociação. É o caso de Denis Kireyev, um dos negociadores ucranianos, assassinado em 5 de Março pelo serviço secreto ucraniano (SBU) por ser muito favorável à Rússia e considerado um traidor. O mesmo destino está reservado para Dmitry Demyanenko, ex-vice-chefe da direção principal do SBU para Kiev e sua região, assassinado em 10 de Março, porque muito favorável a um acordo com a Rússia: foi morto pela milícia Mirotvorets (“Pacificador”). Esta milícia está associada ao site Mirotvorets que lista os “inimigos da Ucrânia”, com os seus dados pessoais, o seu endereço e números de telefone, para que possam ser perseguidos, até mesmo eliminados; uma prática punível em muitos países, mas não na Ucrânia. A ONU e alguns países europeus exigiram o seu encerramento… o que foi recusado pela Rada [parlamento ucraniano].

Finalmente, o preço será alto, mas Vladimir Putin provavelmente alcançará as metas que estabeleceu para si mesmo. Os seus laços com Pequim solidificaram-se. A China surge como mediadora do conflito, enquanto a Suíça entra na lista dos inimigos da Rússia. Os americanos devem pedir petróleo à Venezuela e ao Irão para saírem do impasse energético em que se meteram: Juan Guaidó sai de cena definitivamente e os Estados Unidos devem lamentavelmente reverter as sanções impostas aos seus inimigos.

Os ministros ocidentais que procuram afundar a economia russa e fazer o povo russo sofrer, inclusive pedindo o assassinato de Putin, mostram (mesmo que tenham alterado parcialmente a forma das suas observações, mas não no fundo!) que os nossos líderes não são melhores do que aqueles que odiamos. Porque sancionar atletas russos dos Jogos Para Olímpicos ou artistas russos não tem absolutamente nada a ver com uma luta contra Putin.

Assim, portanto, reconhecemos que a Rússia é uma democracia, pois consideramos que o povo russo é o responsável pela guerra. Se não, então por que estamos a tentar punir uma população inteira pela culpa de um? Lembre-se que a punição coletiva é proibida pelas Convenções de Genebra…

A lição a ser tirada deste conflito é o nosso senso de humanidade de geometria variável. Se estávamos tão apegados à paz e à Ucrânia, por que não a encorajámos mais a respeitar os acordos que ela assinou e que os membros do Conselho de Segurança aprovaram?

A integridade dos meios de comunicação é medida pela sua vontade de trabalhar nos termos da Carta de Munique. Eles conseguiram propagar o ódio aos chineses durante a crise do Covid e a sua mensagem polarizada leva aos mesmos efeitos contra os russos. O jornalismo está a despojar-se cada vez mais do profissionalismo para se tornar militante…

Como disse Goethe: “Quanto maior a luz, mais escura a sombra”. Quanto mais as sanções contra a Rússia são excessivas, mais os casos em que não fizemos nada destacam o nosso racismo e o nosso servilismo. Porque nenhum político ocidental reagiu aos ataques contra as populações civis de Donbass durante oito anos?

Afinal, o que torna o conflito na Ucrânia mais censurável do que a guerra no Iraque, no Afeganistão ou na Líbia? Que sanções adoptámos contra aqueles que deliberadamente mentiram perante a comunidade internacional para travar guerras injustas, injustificadas, injustificáveis e assassinas? Tentámos “fazer sofrer” o povo americano que mentiu para nós (porque é uma democracia!) antes da guerra no Iraque? Será que adoptámos uma única sanção contra os países, empresas ou políticos que alimentam o conflito no Iémen, considerado o “pior desastre humanitário do mundo”? Sancionamos os países da União Europeia que praticam a tortura mais abjecta no seu território em benefício dos Estados Unidos?

Fazer a pergunta é respondê-la… e a resposta não é gloriosa.

Jacques Baud

Fonte: MPI

Notas

[1] N.T. Também conhecido como Quarteto Normandia, o formato Normandia é um grupo diplomático composto por representantes de alto nível de 4 países europeus (Alemanha, Rússia, Ucrânia e França) para resolver o conflito bélico no Leste da Ucrânia (para mais ver wikipedia aqui).

[2] N.T. Exercício conjunto estratégico das forças armadas russas.


segunda-feira, 11 de abril de 2022

O farsante e o novo pequeno Czar


Alguns factos que fundamentam a responsabilidade pessoal do comediante Presidente ucraniano sobre o desenrolar da guerra parece-me não terem sido referidos com o devido relevo. Um deles foi o uso, desde o início, sem qualquer indício, da expressão “genocídio do povo ucraniano” para qualificar um dos supostos objectivos da potência agressora. Outro, numa clara violação das leis da guerra, foi a distribuição de armas a civis, homens adultos, voluntários ou impedidos de saírem do país acompanhando as suas famílias, conscientemente transformando uns em combatentes reais e todos em alvos legítimos a abater (que são agora englobados na população indefesa massacrada). Outro foi o apelo a todas as formas de luta, inclusive ao uso de infra-estruturas civis e humanitárias (de que um centro comercial e hospitais e maternidades desafectados no todo ou em parte das suas actividades são já conhecidos) como locais de combate, de observação ou de armazenamento de munições, em mais uma violação das leis da guerra.

O apelo (ou a ordem) às populações para que não saíssem das cidades sitiadas e as defendessem, contra a possibilidade da sua evacuação através dos corredores humanitários abertos pelo agressor, que por demasiado ostensivo abandonou depois, passando a aceitar em palavras a evacuação, mas sabotando-a sempre que possível (evacuação a que agora, após o efeito propagandístico das destruições e das mortes ter surtido o seu efeito, se apressa a apelar) foi mais um facto revelador do cinismo e do desprezo pela segurança do seu povo. Outro, ainda, foi a localização dos combates essencialmente no interior das povoações e o uso de habitações como refúgio ou postos de atiradores, colocando moradores não combatentes em risco e usando-os mesmo como escudos. A cereja em cima do bolo foram as recentes palavras do ministro Kuleba, o frio estratega, “dêem-nos armas, que nós oferecemos o sacrifício das nossas vidas”. É caso para perguntar: afinal, quem começou por violar as leis da guerra e procurou o “genocídio”? Quem enviou cinicamente o seu povo para a matança?

O comediante Presidente da Ucrânia teve momentos de desânimo e de vacilação, visíveis pelas cedências que foi admitindo poder fazer, entre elas a desistência da pretensão de entrada na NATO e a hipótese de eventuais perdas territoriais. Depois dos ralhetes e dos incentivos dos principais falcões e interessados no enfraquecimento da Federação Russa, o Presidente dos EUA e o P-M da GB, das promessas de envio de mais e sofisticado armamento e de admissão rápida na UE, do adiantamento de dinheiro (por parte dos EUA) para que o Estado falhado pudesse fazer face ao pagamento de salários e de pensões e da atribuição de outros fundos, mais vultuosos, para a reconstrução do país (pela UE, num verdadeiro plano de fomento que permitirá a criação de muito emprego se os fundos não forem desviados pela corrupção endémica que ali grassa) reganhou o ânimo e passou a considerar possível a vitória, quando tudo indiciava uma previsível derrota. Agora, mesmo perante a catástrofe humanitária, a dimensão adquirida pela produção cénica propagandística e de manipulação de massas por eles posta em marcha e que ele se prestou a representar já não lhe permite recuo possível.

A comédia corre o risco de acabar em tragédia. Apesar de continuar a insistir, ainda que de forma ténue, no reatamento de negociações, “Vitória ou Morte” poderá acabar por ser o seu o dilema. No cenário possível de vitória militar da Federação Russa caso não haja intervenção militar directa estrangeira, como se comportarão as aves de rapina que financiaram, montaram e alimentam a farsa e usam o farsante e o povo do seu país e que aguardam pelo banquete dos despojos? O estacionamento de grandes contingentes de tropas de intervenção rápida da NATO nos países limítrofes indicia a possibilidade de estar em preparação uma nova provocação justificadora da entrada, aberta ou dissimulada, destas forças no conflito com o objectivo de impedir ou demorar uma vitória militar russa. A derrota da Ucrânia, a ocorrer, será também a derrota humilhante dos falcões que a financiaram, armaram e usaram, e que ainda poderão vir a ser confrontados com a captura ou a eliminação de quadros militares seus que têm comandado as forças ucranianas. Por isso, eles tudo farão para evitar ou para mitigar a derrota, demorando-a quanto possível. A confirmar-se, restará saber-se se o caluniado inimigo terá a magnanimidade da misericórdia e lançará ao farsante uma bóia de salvação para um desfecho honroso que lhe salve a vida. Esperemos que sim, embora nem ele nem os sequazes a mereçam.

A Federação Russa, por seu lado, tem evidenciado grandes problemas militares — dificuldades logísticas de apoio a uma operação de tamanha envergadura, impreparação, indisciplina e falta de motivação da tropa regular empregada, além do mais em número insuficiente face às forças do seu inimigo, fraqueza na direcção e comando, deficiências nas comunicações e na coordenação entre as diversas unidades, limitada capacidade do seu pequeno número de satélites militares de comunicações e de observação, que não lhe permitem, por exemplo, a localização e a intercepção das colunas de reabastecimento e dos movimentos de tropas, dos aviões não tripulados da Ucrânia e dos seus aliados norte-americanos, dirigidos das suas bases militares nos arredores das fronteiras polaca e romena ou na Alemanha, e que com as informações colhidas dos seus satélites têm sido de suma importância para o sucesso dos ataques às forças russas — assim como cometeu um erro de palmatória, com elevados custos em baixas de combatentes, em perdas de material, no ânimo das tropas e na estabilidade social no seu país, com o que poderá ser considerado uma inversão da ordem de prioridade dos objectivos tácticos que terá traçado para a sua operação militar.

Começar por resolver a situação das Repúblicas separatistas, orientando para aí o grosso da ofensiva militar terrestre, procurando derrotar o exército ucraniano que as fustigava, e por conquistar o seu acesso ao mar — e, eventualmente, conquistar Odessa, de importância vital para a Ucrânia — cujo sucesso forçaria o governo ucraniano a capitular, culminando com uma mudança de regime ou com um acordo de paz contemplando os seus principais objectivos (neutralidade, desarmamento e desnazificação das forças armadas e da Guarda Nacional) teria sido uma melhor opção. A reorientação em curso da ofensiva para a região de Donbass e o aumento dos efectivos empregados parece denotar o reconhecimento do erro. Se imaginou que o cerco de Kiev conduziria a qualquer levantamento popular de apoio à invasão e à queda do regime ou que fixando aí forças ucranianas impediria a sua deslocação para o leste em reforço dos efectivos da ofensiva que aí se preparava, ou, ainda, que faria deslocar as forças ucranianas estacionadas no leste para irem em socorro da capital enganou-se estúpida e redondamente. Na medida em que a realidade complexa se apresenta à compreensão pelas pessoas, restrita à simplicidade concreta veiculada pela propaganda, aos bens destruídos, aos entes queridos feridos e mortos e ao medo da própria morte, cada um lutou como pôde contra o invasor, apesar dos comuns laços históricos, culturais e em muitos casos também familiares, ou se resignou ou, quem pôde, fugiu (aos milhões, mulheres, crianças e velhos, porque os homens novos foram impedidos), e os comandos militares de ambos os contendores sabiam onde se localizava o que de importante estava em jogo.

As erradas concepções ideológicas que serviram de pretexto à invasão, nomeadamente a de que os povos da Ucrânia e da Rússia “são o mesmo povo”, forçando o que seria adequado apenas para a população ucraniana russófona do Donbass, fizeram com que a sua eufemística “operação militar especial” se desenrolasse com alguns pruridos. Se a Federação Russa tivesse usado a mesma táctica dos EUA aquando da sua guerra contra a Jugoslávia (via NATO), em Março de 1999, bombardeando Belgrado por 78 dias, ou da sua segunda guerra contra o Iraque (em conjunto com o seu aliado GB) quatro anos depois, também em Março, mas de 2003, a famosa operação “choque e pavor”, bombardeando continua e indiscriminadamente alvos civis e militares na capital, sem qualquer preocupação com as populações, a incursão terrestre nortenha teria sido desnecessária, evitando o fiasco em que se transformou. Até nisto, EUA e Federação Russa são diferentes, mas são os russos que estão sendo acusados, através de uma campanha de manipulação de massas sem paralelo montada pelos EUA, GB e UE, de cometerem o “genocídio” do povo ucraniano. É de esperar que com a reorientação da guerra para o Donbass, desde que seja efectuada com número de efectivos e com o material adequados, a Federação Russa perca parte dos pruridos com que actuou em relação a Kiev durante a primeira parte da campanha. Depois do que a têm acusado que labéu resta para colar-lhe? Bem, sempre podem arranjar um novo, que a criatividade dos manipuladores não tem limite.


sexta-feira, 8 de abril de 2022

Os russos, esses bárbaros euro-asiáticos, comprovam o que realmente são: além de "feios, porcos e maus", burros e masoquistas...


Depois do massacre de Bucha, e enquanto não vêm o de Borodyanka e o muito pior de Mariupol, para não deixar esmorecer as emoções necessárias para a legitimação das grandes jogadas políticas, mornas apenas com os choros nos funerais, os russos cometeram mais um crime de guerra, com o ataque à estação ferroviária de Kramatorsk, na região de Donbass, em que mataram mais de 50 civis indefesos.

Mesmo que os russos digam que há muito não usam daqueles mísseis e o número de série deste seja próximo do de outros empregados em dias, meses e anos anteriores pelas forças ucranianas, os media engajados e o regime ucraniano atribuíram-lhes de imediato o crime hediondo. Também neste caso “não há dúvidas sobre a autoria”. Dúvidas são apenas para os crimes de guerra comprovadamente cometidos pelos ucranianos e por eles, ufanos, divulgados. E todo o civil e soldado que morre na guerra baleado, de doença, de susto ou soterrado é vítima de crime, porque guerra é jogo de computador.

Desses crimes, que vitimaram soldados russos feitos prisioneiros ou feridos — uns praticados por soldados ou por milicianos ucranianos e outros por milicianos georgianos aliados — igualmente hediondos, os media não passam as imagens colhidas em tempo real, suponho que pela reveladora selvajaria, e, quando os referem ao de leve, dizem que a autoria “parece ser” dos ucranianos. Seja o que for, a realidade é o que as centrais de manipulação dos EUA e seus aliados querem que seja.

Não por acaso, mais este massacre ocorre no dia em que a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, visitou Bucha e entregou em Kiev ao comediante Presidente da Ucrânia o questionário de início do processo de adesão daquele país à União Europeia, referindo que em vez do prazo habitual de anos será aprovado em semanas, com regras à medida (porque se a Ucrânia já dantes era um país democrático como nós, em guerra, então, imagine-se!).

E também ocorre no dia em que o Chanceler alemão, Olaf Scholz, visitou o P-M britânico, Boris Johnson, ouvindo deste desbragado falcão as últimas sobre a sua disponibilidade para fornecer armas nucleares à Ucrânia. É um dia histórico, como dizem, sem esconderem a alegria, as falcoas comentadoras e as moçoilaa emocionáveis, mas cínicas, e os rapazolas sem vergonha que se imaginam jornalistas da TVI/CNN-Portugal (a central da guerra psico emitindo em contínuo e repetindo vezes sem conta as mesmas imagens e “notícias” da mais despudorada manipulação).

Estamos vivendo tempos em que os lances arriscados se sucedem a um ritmo alucinante. A motivação de todos os falcões é a derrota da Rússia, mas a presa por eles cobiçada não é idêntica. Para a rapina da Ucrânia, a Alemanha, usando a capa da UE, coloca-se à frente, mas adiante de si tem a Polónia, a mais sacrificada e até agora, com a GB e os EUA, também a mais envolvida. Para os outros, o despojo, mais saboroso e variado, fica um pouco mais acima.

Depois de tantos erros — subestimando a capacidade defensiva do seu inimigo, armado até aos dentes, e sobrestimando a sua capacidade ofensiva, apenas imaginada, invertendo a ordem de prioridade dos objectivos e usando tropa fandanga impreparada e esfaimada, “coitados, sem telemóvel” — os russos não têm emenda, parece que nada aprendem e persistem na matança de civis indefesos, acirrando contra si o ódio do mundo.

Os russos, esses bárbaros euro-asiáticos — tão diferentes dos ucranianos, esses brancos alvos, louros e de olhos azuis tão europeus como nós e que comungam dos nossos valores do “Estado de direito democrático” — comprovam o que realmente são: além de “porcos, feios e maus”, burros e masoquistas. Tais selvagens já para as estepes e a tundra siberiana! Isolemo-los da civilização!


domingo, 3 de abril de 2022

Voltou o "genocídio", agora devidamente escorado num massacre de civis


“Genocídio”, “terrorismo nuclear”, “crimes de guerra”, “crimes contra a humanidade” e ontem, em entrevista, de novo, “genocídio”, são as acusações recorrentes que o comediante Presidente da Ucrânia, ele próprio, tem proferido desde que começou a invasão do seu país, dando o mote diário para a intensa campanha de propaganda a que se tem assistido. É grotesco, e só um farsante, qual verdadeiro artista "do circo, da rádio, TV e disco e da cassete pirata" se prestaria a um papel tão infame.

Nem a propósito, hoje foram divulgadas imagens chocantes de dezenas de cadáveres de civis em caves de edifícios e espalhados ao longo de uma rua de Bucha, uma localidade dos arredores de Kiev, colhidas pelo Ministério da Defesa ucraniano e não por qualquer órgão de informação, mesmo dos engajados, cuja divulgação denota claramente o objectivo de corroborar a tese do “genocídio”. São crimes graves, seja quem for que os tenha praticado e mesmo que se tratem de mais uma operação provocatória de “falsa bandeira”, que merecem ser investigados.

Foi afirmado que os mortos, homens e mulheres, jovens e idosos, seriam todos civis desarmados. Algumas das vítimas tinham a típica braçadeira branca de apoiante do exército russo, e essas e outras, pelas condições em que foram mortas, com as mãos e os pés atados, mostravam terem sido sujeitas a sevícias e depois sumariamente executadas. Todos os requisitos que caracterizam um massacre estavam preenchidos. Faltava saber quando, por quê e por quem fora cometido, mas antes que tal fosse apurado foi atribuído às forças russas.

A guerra contra o exército invasor russo, de que uma parte dos combatentes ucranianos é aliada, e onde campeia o ódio, é propícia para a ocorrência de crimes de guerra. Quando o governo distribui armas a civis, transformando-os em combatentes, aumenta o risco de que eles, tal como os militares, sejam objecto desses crimes. E quando a maior parte dos combates ocorre nas povoações (aldeias, vilas e cidades) pela disputa do seu controlo é natural a ocorrência de elevado número de mortos entre as populações indefesas.

Esta situação é agravada, na guerra que se trava na Ucrânia, pela intervenção de forças para-militares e de milícias civis ao lado do exército regular ucraniano, e, em ambos os lados, de contingentes de mercenários, em grande número com motivação religiosa, étnica e política de extrema-direita e de cariz neo-nazi. Nestas condições, a destruição e a violência próprias da guerra são exacerbadas pela crueldade da motivação ideológica destes combatentes, o que aumenta a possibilidade da ocorrência de crimes de guerra. Eventualmente, este não irá ser o único nem o pior.

Este massacre de civis não ter sido divulgado logo após a saída das forças russas de ocupação, mas só depois da entrada em acção das forças para-militares e das milícias neo-nazistas ucranianas nas vilas e aldeias abandonadas, “limpando-as de colaboracionistas e de sabotadores”, reocupando-as e bombardeando o exército russo em retirada para a Bielorrússia (com carros de combate incendiados após terem sido atingidos, num cenário de destruição verdadeiramente dantesco), e estar sendo aproveitado para uma operação propagandística de grande envergadura, torna suspeita a autoria que lhe foi atribuída.

Os divulgadores do massacre, porém, não pretendem a actuação em tempo útil do Tribunal Penal Internacional para punir os responsáveis, caiba a autoria a quem imputam ou a outros e, inclusivamente, sejam os factos reais ou não, mas o efeito emocional de reacção à violência das imagens ou das descrições para obter o apoio das opiniões públicas ou dos responsáveis políticos para outros seus objectivos imediatos. Neste caso, foi notório o apelo à intensificação da guerra económica (as chamadas sanções) contra a Federação Russa e ao fornecimento de armamento mais diversificado e eficaz à Ucrânia.

Quando a Rússia intensifica a sua ofensiva na região de Donbass e a alarga à região de Odessa, demonstrando a intenção de cortar o acesso da Ucrânia ao mar, outro objectivo imediato da propaganda em torno dos massacres visou a sabotagem das negociações em curso para um cessar-fogo, porquanto o Presidente ucraniano passou a declarar como sua pretensão nada menos do que a vitória na guerra, quando há pouco admitia algumas cedências ao invasor (por cujas vacilações terá recebido algum ralhete do patrão americano). Até parece corresponder ao lançamento da nova cartada urdida pelos EUA aquando do périplo europeu do seu Presidente.

A operação propagandística de que o massacre é objecto irá ser amplificada até à náusea pelos EUA, pelos seus aliados e pelos seus media. Até que produza os efeitos pretendidos, uma investigação independente dos crimes não irá ser efectuada, perdendo-se elementos de prova relevantes. Faz lembrar os embustes em que os EUA são peritos, como o das “mortes de dezenas de bebés numa maternidade” no Kuwait e o das “armas de destruição massiva” atribuídas ao Iraque, que apesar de grosseiras mentiras produziram a emoção necessária para a naturalização das invasões deste país em 1991 e 2003.

Acirrando o ódio contra os russos com as imagens de cadáveres e o uso de palavras desmedidas (nada menos que “genocídio”), o objectivo fundamental pretendido é a escalada da guerra e o seu prolongamento a qualquer preço, para exaurir quanto possível o inimigo russo. Antes da etapa nuclear há ainda muito cartucho para queimar, muito edifício para destruir e muito ucraniano para morrer (e quantos mais refugiados regressarem mais haverá). E, quando for necessário, a Bielorrússia estará ali à mão, à mercê dos vizinhos ocidentais mais enraivecidos.

Para uma tarefa bem menor, a investigação dos negócios no país do filho do actual Presidente dos EUA, o anterior Presidente, Donald Trump, propunha-se pagar ao comediante Presidente da Ucrânia 400 milhões de dólares, proposta que terá sido recusada. Quanto, ou o quê, terá prometido o actual Presidente para a função tão arriscada e atroz a que o comediante se prestou e vem desempenhando de forma tão diligente é o que falta saber-se. Mas a História dirá.


ADENDA (2022.04.05)

Foi noticiado que a Comissão Europeia, em retaliação, ampliou a guerra económica contra a Federação Russa: proibição da importação de carvão, confisco de activos de outros bancos russos e proibição de navios mercantes e de transportes rodoviários russos atracarem em portos ou cruzarem os países membros. Parece que a senhora Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão, está fazendo jus à família no ódio à Rússia, nomeadamente ao avô nazi implicado em massacres na Polónia e por isso condenado.

Os peneireiros caseiros, porque as novas medidas pouco afectarão o reduzido comércio da república das bananas com a Federação Russa, quais sabujos dedicados aceitarão pressurosos as novas medidas da guerra económica. Resta saber se o reeleito nacionalista Viktor Orbán, da Hungria, declaradamente não hostil à Federação Russa, também acatará as decisões da CE, tomadas à revelia do Conselho Europeu, ou se romperá a proclamada unidade da UE.

E foi também noticiado que a Alemanha, a Bélgica, a Dinamarca, a França, a Itália, os Países Baixos, a Suécia e a Espanha, seguindo o que já fora feito pela Polónia e por um dos países bálticos, decidiram a expulsão de funcionários das Embaixadas da Federação Russa nos seus países. E, em consonância, o Alto Representante Josep Borrell, decidiu a expulsão de 19 membros da Missão Permanente da Federação Russa para a União Europeia, em Bruxelas.

Com o seu habitual complexo de inferioridade, os peneireiros caseiros não quiseram ficar p'ra trás e decidiram igualmente expulsar da república das bananas dez funcionários da Embaixada da Federação Russa, certamente espiões do inimigo tão perigosamente próximos do Comiberlant. E preparam-se para convidar o comediante, qual lídimo representante dos “nossos valores” e do “Estado de direito democrático” que é, fora de qualquer dúvida razoável, a Ucrânia, para discursar no parlamento.


sexta-feira, 1 de abril de 2022

Contradições do "mundo livre"


O chamado “mundo livre”, não o da propriedade privada, que lhe é anterior, mas o da “livre iniciativa”, da “livre concorrência” e do “livre comércio”, é um poço de contradições, à medida das conveniências. Para além das facadas no “livre comércio” dadas pelas chamadas “sanções económicas”, o eufemismo arranjado para a “guerra económica”, sofreu agora uma nova investida, mais uma vez pela mão do chefe de fila do “mundo livre”, o Presidente dos EUA.

Este paladino do “mundo livre” acaba de determinar a produção forçada de petróleo nos poços que não estejam em produção instalados em terrenos federais. Ele não se limitou a recomendar ou, sequer, a pedir, determinou e pronto. Sem falar nos atropelos às "liberdades individuais", as liberdades no “mundo livre” são meramente instrumentais, propaganda de conveniência. E já lá vai o tempo da guerra contra o comunismo, a “cortina de ferro”, onde não existiam tais liberdades.