segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Façam por ter um Bom Ano de 2008

Para todos os visitantes e leitores: façam por ter um Bom Ano de 2008. Em caso de necessidade, alarguem o intervalo entre o Bom e o Razoável. Tratem de ser felizes, porque a vida corre veloz!

4 Comentários:

Às 12:19 da tarde, janeiro 07, 2008 , Anonymous Anónimo disse...

Boa tarde JMC.

É com satisfação que registo este convite ao voluntarismo, implícito na mensagem de início de ano que deixa aos seus leitores. Eu, por mim, vou tentar fazer o que puder. Que, como dizia o velho Fernando Vale, lá para as minhas bandas, “ quem faz o que pode faz o que deve”. A si desejo-lhe entusiasmo e arte para continuar a produzir mais conhecimento, para satisfação dos seus leitores.

A leitura recente de alguns textos de Hannah Arendt, onde se fala de “ex-comunistas” e “antigos comunistas”, levou-me a uma releitura de alguns textos seus – refiro-me a “As dificuldades enfrentadas pela crítica teórica do marxismo” de 27.8.2007 e “O limbo em que pairam muitos ex-comunistas” de 29.9.2007, que me suscitaram as reflexões que aqui deixo.

Não subscrevo a análise de Hannah Arendt, pelo menos naquilo que tem de generalização – embora a autora se esforce por recusá-lo – e também me parece perder alguma legitimidade na apreciação que faz do comportamento dos ex-comunistas, quando estes se pretendem, em nome do seu passado, garantes privilegiados da democracia; ela própria me parece cair na mesma pecha, ao pretender-se mais americana que os americanos, fazendo igualmente jus à velha metáfora, “ser mais papista que o Papa”. Quanto ao mais, reconheço-lhe o mérito de ter identificado uma questão, que não me parece menos real nem menos importante que aquelas que JMC, com a forma certeira e mordaz de sempre, coloca, a propósito do que se passa aí na nossa praça.

O zelo afectado e excessivo que alguns ex-comunistas de referência colocam na defesa da democracia, encontra paralelo apenas na forma como alguns pais tardios super-protegem os seus filhos; e dá origem às mesmas consequências que ocorrem nas crianças: tornam-se frágeis, anémicas, e não podem sair à rua, apanhar sol ou chuva, sem o risco de se constiparem.

Ora, no meu modesto entender, democracia é precisamente coisa de rua. Pública. Espaço onde o homem se confronta com as suas limitações e luta pela sua superação. Ou, escrito em sintaxe judaico-cristã, espaço de pecado, confissão e emenda. Mas nunca de beatitude.

Lembro-me, a propósito, de aqui há tempos um desses beatos convertidos, a propósito do Tratado da União, ter invocado o facto deste ser demasiado extenso e complexo, e de o povo não estar “preparado” para o compreender, para fundamentar o seu desacordo relativamente a um eventual referendo.

(Consequente com o mesmo critério, eu diria mesmo que o povo deveria ser proibido de votar, pois se há coisa para que ele não está “preparado” é precisamente para isso. Assim, sim: teríamos uma democracia no seu mais elevado grau de pureza, asséptica, imaculada e sem pecado :-)). Mal por mal, por mim e apesar de tudo prefiro a versão do Sócrates. E, quanto a estes “ex”, seria preferível que se tivessem mantido organizados nos seus guetos. Porque, para a democracia, apenas se tornam perigosos quando viram democratas :-)).

E depois deste bocadinho de má-língua blogosférica, para iniciar bem o ano, permita que retome o fio da meada em tom mais sério.

Em minha opinião, a questão dos “ex”, quer nos aspectos referidos por JMC quer naqueles que Hannah Arendt levanta, não me parece um fenómeno exclusivo dos comunistas (ex). Ex-maridos, ex-mulheres, ex-fumadores, ex-padres, ex-etc., são outros tantos exemplos onde a condição de “ex”, ao contrário de significar o corte com um determinado tipo de relação, remete antes, em muitos casos, para uma nova relação para a qual a anterior evoluiu.

No que se refere os ex-fumadores, é conhecida a relação tensa de recusa que mantêm com o tabaco, que se prolonga por vezes durante décadas.

No caso da ex-conjugalidade, a situação de rotura é em muitos casos apenas formal e aparente. E, o que se sucede à separação e ao divórcio é de facto uma relação de conflitualidade, visível ou calada, por vezes até mais intensa do que a relação anterior; onde filhos, divisão dos bens e ciúmes relativamente a novos companheiros constituem ingredientes e pretextos para alimentar a chama e a ambiguidade.

Relativamente às roturas religiosas são inúmeros os exemplos de casos em que ex-padres ou leigos se tornam ainda mais anti-clericais do que aqueles que simplesmente nunca tiveram qualquer filiação ou credo religioso, fazendo da militância pela negativa uma causa pela qual se batem de forma tão ou mais ardente que pela anterior.

A condição de “ex” não significa pois, em muitas situações, uma relação terminada. Uma ausência de relação. Ao “ex” associa-se antes, muitas vezes, uma relação residual da relação anterior, que pode durar mais ou menos tempo, e, outras vezes, constitui-se mesmo uma relação de negação da anterior, por vezes até mais forte do que ela. Mas não de rotura. Aliás, apenas se pode negar aquilo que existe.

Mas, na história recente da sociedade portuguesa, um dos casos mais paradigmáticos que conheço, no que se refere a ambiguidade dos “ex”, é o que respeita a guerra colonial e os ex-combatentes. Mesmo aqueles que participaram nela já conscientes da sua natureza e dos seus objectivos, ou que deles adquiriram posteriormente consciência – legitimar e perpetuar quinhentos anos de escravatura, de ocupação e de humilhação de outros povos – não escondem ainda hoje, disfarçam mal, ou, nos casos mais boçais exibem mesmo orgulho de nela ter participado, como se de epopeia heróica se tivesse tratado, em vez de motivo no mínimo de vergonha. E existem até os que encontram legitimidade para esse seu sentimento, na nova realidade que são as novas formas de miséria que tomaram conta dos novos países, na sequência das respectivas independências.

Um dia destes voltarei para comentar outras questões dos seus escritos, em que tenho vindo a reflectir.

Cumprimentos

nelson anjos

 
Às 8:46 da manhã, janeiro 08, 2008 , Blogger JOSÉ MANUEL CORREIA disse...

Viva Nelson Anjos.

Apesar da falta de vagar, respondo ao seu comentário, que agradeço. A abordagem do caso dos ex-comunistas não está esquecida. O texto está meio escrito há algum tempo, mas não tem havido vagar nem disposição para grandes incursões blogosféricas.

Gostaria de frisar que o fundamentalismo de muitos ex-comunistas advém do carácter emocional, se não mesmo de fé, com que abraçaram essa ideologia totalitária. Julgo ter sido também a fé que os fez abraçar as ideologias políticas mais conservadoras e reaccionárias do capitalismo, dado que muitos deles se passaram de armas e bagagens para o campo que dantes juravam combater, sem que tenham efectuado qualquer reflexão profunda. A intensidade da abjuração não advém tanto do repúdio consciente, mas da necessidade pessoal da expiação de sentimentos de culpa e da sua exteriorização de forma mais amplificada, de modo a ganhar credibilidade.

No caso de ex-maoistas, a essa componente emocional juntava-se a imaturidade própria da juventude de muitos deles, que não lhes possibilitava grande discernimento. Mas também a alguns destes já não foi a imaturidade que os fez acabarem por se instalar no sistema que dantes combatiam com ferocidade, mas a falta de carácter e o puro oportunismo.

O comunismo, ideologicamente é um autêntico logro; politicamente é uma desilusão e uma barbaridade, como foi e é comprovado por todo o lado. Depois da história do último século, é surpreendente como ainda hoje existem intelectuais e partidos que se afirmam comunistas; e os casos do PCP e dos intelectuais comunistas portugueses são merecedores de estudo, pela ortodoxia, que os torna incapazes de questionarem o óbvio, e pela paragem no tempo.

Mas não estou seguro de que muitos ex-comunistas sejam assim tão acérrimos defensores da democracia e das liberdades. As suas convicções políticas são muito pragmáticas, não advêm do cultivo desses valores, e podem ser comparados a tecnocratas ou a meros oportunistas natos, de que cuja vacuidade este Sócrates é o exemplo mais notório. Esta gente está segura de que o povo sofre do sindroma da mentalidade submissa, no seio da qual eles foram também criados, e quando se apanham no poder tendem a tornar-se políticos autoritários e pequenos déspotas.

Não participei nas guerras coloniais; em determinada altura foi-me até proposto um projecto de deserção para o estrangeiro, apoiado pelo pc, no caso de ser mobilizado. Não sou pessoa indicada para falar do assunto. A juventude dos participantes não profissionais nas guerras coloniais, mesmo sendo adeptos comunistas, não lhes concedia grande conhecimento nem convicção, além de não disporem dos meios pessoais para delas escaparem e de só tarde no tempo o pc ter passado a poder disponibilizar alguns parcos esquemas de deserção, devido à sua condição de pequeno partido e à situação de clandestinidade em que existia.

Não posso deixar de reconhecer que me impressiona a complacência com que hoje alguns comunistas e ex-comunistas encaram a sua participação nessas guerras e relatam as peripécias que viveram. Compreendo que falar disso possa ser uma sadia necessidade para exorcizar os fantasmas que a guerra desencadeia. E entendo que os participantes nas guerras não têm qualquer culpa acrescida. Participantes ou não participantes, fomos todos culpados de um drama que não decidimos. Dessa culpa colectiva só escapam os que se opuseram activamente às guerras como puderam e em coerência com o que defendiam delas desertaram ou se escapuliram antes de serem mobilizados.

De qualquer modo, comunistas ou ex-comunistas não foram nem são defensores do colonialismo, português ou outro. Não creio que mesmo simples adeptos sem formação política tenham a veleidade de defender a bondade de uma realidade histórica de que não foram decisores, que os ultrapassou por completo e que ficou constituindo um retrocesso em termos civilizacionais, como é maioritariamente aceite por todo o mundo.

Julgo que a epopeia marítima e comercial dos portugueses não pode ser reduzida ao comércio negreiro nem ao colonialismo esclavagista que lhe sucederam. Na Índia, as possessões portuguesas, conquistadas e mantidas pela força, é certo, não se caracterizavam por domínio esclavagista, tanto mais que a política do Albuquerque, e que acabou por se manter, incentivava a miscigenação como forma de consolidação do poder. E o Brasil, o país mulato por excelência, embora construído com base no trabalho escravo usado pelo capitalismo nascente, é outro exemplo de como a política colonial dos portugueses usava a miscigenação para se consolidar. As colónias africanas, sim, podem ser apontadas como exemplo do colonialismo esclavagista, mas também aí tenho sérias dúvidas acerca da expressão territorial ou populacional do domínio português e da sua famosa duração de quinhentos anos, pois que fora de pequenas regiões costeiras de Angola e de Moçambique ou das ilhas, talvez pouco tenha ultrapassado um século.

Por outro lado, facilmente glorificamos ou crucificamos os povos, esquecendo que eles são, na maioria dos casos, massas informes de gente humilde facilmente dominada, que se deixam submeter em nome da sobrevivência. Confundimos os povos com as suas elites, castas e classes dominantes, que são quem decide o bom e o mau. E julgamos que enquanto fazem a história os povos são detentores de projectos altruístas para fazê-la. Pura ilusão, comparável à ilusão dos comunistas pretenderem erigir um projecto social com base na vontade altruísta de acabar com a exploração.

No caso do colonialismo, tendemos a esquecer que muitos dos povos colonizados eram também eles colonizadores de outros povos, e que as suas castas dominantes praticavam a escravidão de súbditos ou de cativos.

A realidade é muito mais complexa do que os esquemas a que por vezes tendemos a reduzi-la. Seremos nós mais esclarecidos no presente do que o foram os nossos antepassados nos seus presentes? Não temos resposta para tal questão e poderemos apenas desejar ser.

Cumprimentos.

JMC.

 
Às 8:08 da tarde, janeiro 15, 2008 , Blogger J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sabe JMC

Não tenho medo de papões e muito menos do "comunismo" que critica. A conversa do totalitarismo é muito exagerada e, repare, Marx não é um pensador transparente. Se não conseguir manejar a negação determinada, mude de cruzada: existem outras lutas mais reais, como as reformas do ensino.
Não negou Marx nestes dois "erros" que refere. E respeite os profetas do Antigo Testamento, porque esta leitura de Marx é velha, muito velha. Fiquei desiludido com este seu texto.
Mas prometo continuar a frequentar o seu blogue. :)))

 
Às 10:29 da tarde, janeiro 15, 2008 , Blogger JOSÉ MANUEL CORREIA disse...

Já percebi os porquês do seu paleio, como lhe disse no seu blog.

Para saber do que falar deve ir estudar O Capital (ler e, depois, estudar).

JMC.

 

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